O fim da coligação PSD-CDS abriu uma
crise política que exige a convocação de eleições antecipadas. Isso é uma
condição necessária para o aparecimento de uma alternativa política ao governo
de Passos Coelho, mas não é uma condição suficiente. Receio bem que estejamos
perante uma situação em que a direita já não é capaz de governar, mas a
esquerda ainda não é capaz de o fazer. O caldo habitual donde já nasceram muitas
soluções bonapartistas.
Não creio que, nos próximos meses, o
PS, o PCP e o BE sejam capazes de ultrapassar as divergências que bloqueiam a
possibilidade de formação de um governo de esquerda. E, nesse caso,
provavelmente, das próximas eleições sairá um governo minoritário liderado por
António José Seguro, pontualmente apoiado pelo CDS e manietado pelas exigências
da Comissão Europeia.
Repetir experiências passadas, mudando
de governantes sem mudar de políticas, pode ter um efeito devastador sobre o
actual sistema político-partidário e mesmo sobre a confiança dos portugueses
nos mecanismos da democracia representativa.
Prevenir a possibilidade de que o
aprofundar da crise económica dê origem a uma tentação totalitária parece-me
que, hoje, deve ser uma preocupação central de todos os democratas. Os partidos
actualmente existentes estão reféns de lógicas de auto-afirmação que resultam
apenas da vontade de satisfazer os interesses e anseios das suas redes
clientelares e parecem cada vez menos capazes de ouvir os cidadãos comuns.
Sendo assim, a defesa do regime democrático terá que passar necessariamente
pela possibilidade destes fazerem ouvir a sua voz no seio do parlamento sem
serem obrigados a sujeitar-se a uma intermediação partidária.
Na minha opinião, o parlamento que
sair das próximas eleições legislativas deve ter na sua agenda a revisão da lei
eleitoral, abrindo-a à possibilidade da apresentação de candidaturas
independentes ao cargo de deputado. Penso que isso implicaria o aparecimento de
círculos uninominais, onde o eleitorado seria chamado a votar em candidatos
apresentados ou não pelos partidos, sendo eleito aquele que reunir um maior
número de votos. Sabe-se que este sistema tem a desvantagem de distorcer
gravemente a proporcionalidade entre os votos recebidos pelos diferentes
partidos e o número de deputados que estes são capazes de eleger. Na prática,
pode saldar-se pela eliminação dos partidos mais pequenos e, consequentemente,
num empobrecimento da representatividade do parlamento. Contudo, isto pode ser
contrariado pela criação de um círculo nacional, onde se apresentariam listas
partidárias cujos candidatos seriam eleitos de acordo com a percentagem de
votos obtida.
Por exemplo, numa AR formada por 200
deputados, 100 seriam eleitos em círculos uninominais e os restantes no círculo
nacional. Num sistema de proporcionalidade directa, um pequeno partido que não
conseguisse vencer em nenhum círculo uninominal, mas obtivesse, digamos, 8% dos
votos no círculo nacional, elegeria 8 deputados.
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