sexta-feira, 30 de novembro de 2012





Impasses actuais e perspectivas futuras

As sondagens publicadas durante o mês de Novembro oferecem-nos uma imagem muito clara de uma situação de impasse político.

Comecemos pela análise das intenções de voto em futuras legislativas. A sondagem da Pitagórica, realizada entre 9 e 16/11, publicada no jornal i, dá-nos os seguintes resultados: PS – 36,2% (mais 8% do que nas últimas eleições); PSD – 26.4% (menos 12%); CDU – 9,8% (mais 2%): CDS – 9,8 (-2%); BE – 7,5% ((mais 2%). Estes resultados estão, no essencial, de acordo com aqueles que foram apresentados pelas sondagens anteriormente realizadas pela Aximage e pelo Eurosondagens. Parecem-me, portanto, fiáveis.

Logo, a coligação governamental já não dispõe de um apoio eleitoral maioritário: o PSD e o CDS somariam apenas 36,3% dos votos. Este facto corresponde a uma avaliação negativa da acção do governo: nota 5,8 numa classificação de 0 a 20, segundo a Pitagórica.

Contudo, segundo a mesma sondagem, apenas 24,7% se pronuncia a favor da realização de eleições antecipadas. Porquê? Provavelmente, porque os portugueses consideram não estarem reunidas as condições necessárias para a formação de um governo alternativo maioritário e considerarem que um governo minoritário do PS, comprometido com o memorando da troika, não governaria de forma muito diferente. Portanto, a maioria dos portugueses nem concorda com a acção deste governo nem antevê a possibilidade de eleger outro melhor.

A formação de um governo de esquerda, apoiado pelo PS, pela CDU e pelo BE (com um apoio eleitoral superior a 50%) talvez pudesse oferecer uma saída para este impasse. Contudo, essa solução é inviável desde logo por causa daquilo que separa estes partidos a respeito do cumprimento do memorando. O que pensam os portugueses a esse respeito?

Segundo a sondagem da Pitagórica, 63,5% dos portugueses acham que o memorando deve ser cumprido, embora 84,1% defendam que deva ser renegociado. Nota-se a este propósito uma evolução significativa em relação a 2011, quando os partidos que se comprometeram com a aplicação do memorando (PS, PSD e CDS) somaram 78,5% dos votos. Mas a maioria dos portugueses continua a manifestar-se contra uma denúncia unilateral do seu cumprimento. A percentagem daqueles que admitem essa hipótese (27,5%) corresponde à daqueles que admitem a saída do euro (26,9%). Penso que é possível concluir daqui que, para a maioria dos portugueses, “rasgar o memorando” implica “sair do euro”, e recusam essa solução.

Esta associação talvez explique por que, apesar de uma subida consistente nas intenções de voto, as sondagens publicadas continuem a atribuir menos de 20% dos votos aos partidos anti-troika. Ou seja, embora essa não seja a intenção declarada desses partidos, a intenção de voto na CDU e no BE tende a aproximar-se da percentagem daqueles que estão dispostos a sair do euro.

Aparentemente, o PS é o partido que mais se aproxima dos sentimentos manifestados pela maioria dos inquiridos: crítica a acção do governo, mas sem exigir a sua demissão; e defende a renegociação “civilizada” do memorando, mas sem arriscar uma ruptura que possa conduzir à saída do euro.

Simplesmente, na prática, esta estratégia “cautelosa” deixa tudo como está: o PSD/CDS no governo e o governo nas mãos da troika. E tanto o governo como a troika consideram que o memorando não tem que ser renegociado, mas rigorosamente cumprido. Entretanto, à subida enorme dos impostos, segue-se a redução brutal das funções sociais do Estado e o agravamento da crise económica.

Mais cedo ou mais tarde, o povo vai exigir a demissão deste governo e a construção de uma alternativa política. Se os partidos que agora se manifestam na oposição não a souberem construir, alguém se vai lembrar de convocar a tropa para resolver a situação. A sondagem da Pitagórica diz que 1/3 dos portugueses admitem a hipótese de uma intervenção militar. Muitos deles sonham, talvez, com um “novo 25 de Abril”. Mas receio bem que, nesse caso, nos confrontemos antes com um “novo 28 de Maio”.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012



“Rasgar o memorando”. E depois?

“Rasgar o memorando da troika” deve ter sido das afirmações mais repetidas e mais consensualmente aplaudidas durante a VIII Convenção do Bloco de Esquerda. Também se ouviu falar da necessidade de renegociar montantes, juros e prazos de pagamento da dívida, como condição do relançamento da economia e do combate ao desemprego.

Em princípio, uma coisa decorre da outra, mas coloca-se aqui uma questão de prioridades: deve começar-se por renegociar os termos do pagamento da dívida e, em função dos resultados alcançados, rever este memorando; ou, pelo contrário, deve começar-se por denunciar o memorando e partir da recusa do seu cumprimento para uma renegociação da dívida?

A primeira opção seria mais facilmente aceite pelo PS mas, partiríamos de uma posição mais fraca e tal facto poderia redundar numa revisão minimalista do memorando, inaceitável para o Bloco.

A segunda opção, parece ser aquela a que esteve na mente dos delegados à VIII Convenção. Em contrapartida, excluiria o PS e apenas se afirmaria como uma posição de força se o Bloco assumisse como resposta à possível recusa dos nossos credores em negociar nesses termos, a alternativa do incumprimento da dívida e, consequentemente, a saída do euro.

Ora, essa hipótese tem sido recusada pela direcção do Bloco. Sendo assim, qual é a sua resposta no caso da denúncia do memorando resultar no fim das transferências de capital proporcionadas pela troika? Qual é a sua resposta no caso da exigência de renegociação da dívida tiver como resultado um rotundo “Não”?

A direcção do Bloco tem todo o direito de recusar o cumprimento do memorando da troika. Já todos percebemos que a política que ele preconiza não é solução para o fim do endividamento e só pode ter como resultado mais falências, mais desemprego e mais pobreza. Mas não tem o direito de esconder dos seus aderentes e eleitores todas as consequências possíveis que advêm dessa recusa.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012



Procurar consensos

Construir alternativas



António José Seguro afirmou ontem, numa entrevista à SIC, que a primeira medida que tomaria, se fosse primeiro-ministro, seria renegociar com os credores da dívida público os prazos e os juros do seu pagamento. O Bloco de Esquerda pensa que, além disso, devem ser revistos os montantes da dívida. E, recentemente, Jerónimo de Sousa defendeu a indexação dos limites do serviço da dívida a 2,5% do valor das exportações. Os parceiros sociais representados no CES consideraram que as metas previstas pelo memorando da troika são inalcançáveis e o Orçamento de Estado, definido em função dessas metas e aprovado na AR pelo PSD e pelo CDS tem sido considerado, inclusive por pessoas comprometidas com os partidos do governo, inexequível.

Os partidos que se afirmaram contra o memorando da troika obtiveram, nas últimas eleições legislativas, cerca de 13% dos votos. E se o PCP conseguiu segurar o seu eleitorado tradicional (aquele que, em qualquer circunstância, vota sempre na CDU), a posição anti-troika do Bloco de Esquerda traduziu-se numa forte penalização eleitoral (perda de metade dos votos e do grupo parlamentar).

Por parte dos partidos do “arco da troika”, distinguiam-se duas posições diferentes: O PS assumiu o resgate financeiro e as condições impostas pelo memorando como um mal necessário, o PSD e o CDS consideraram que os termos do memorando coincidiam com o seu próprio programa e, no governo, apostaram mesmo em “ir mais longe” do que aquilo que ele impunha. Mas todos eles, PS, PSD e CDS (e, com eles, 78,3% do eleitorado) consideravam-no como inevitável e propuseram-se colaborar no seu cumprimento.

Passado cerca de um ano e meio, a situação alterou-se completamente e gerou-se um consenso muito alargado acerca da impossibilidade de cumprir o tal memorando “inevitável”. Mais ainda, percebe-se hoje que os únicos frutos seguros da aplicação desse programa são a destruição da economia portuguesa, o crescimento imparável do desemprego e o alargamento de situações de pobreza a sectores consideráveis da classe média.

Evidentemente, nem todos os críticos da fidelidade canina do governo aos termos do memorando da troika, apresentam as mesmas soluções alternativas. Isso não significa que não hja lugar para consensos pontuais e que isso não deva ser explorado tendo em vista a construção de alternativas futuras o mais abrangentes possíveis.