sexta-feira, 21 de junho de 2013



As eleições autárquicas e o governo PSD – CDS

Ouvi ontem, no Porto Canal, Ricardo Rio a repetir estafados argumentos em defesa da política prosseguida pelo governo de Passos Coelho. Os objectivos dessa política já não podem ser escondidos e vão muito para além das medidas impostas pela troika como garantia do reembolso, com juros, da “ajuda” que caridosamento nos concedem.

Aquilo que o governo pretende não se confina à aplicação acrítica das medidas imposta pelo “memorando”, mas visa o desmantelamento do nosso incipiente Estado social. Trata-se, em última análise, da defesa liberal do “Estado mínimo”, ou seja, da redução das funções do Estado à Justiça, à Defesa e à Segurança e, quando muito, a uma função assistencialista circunscrita aos casos de extrema pobreza.

A prossecução deste projecto passa pela precarização das relações laborais pela redução dos gastos com as reformas, pensões e outras prestações sociais e pelos cortes sucessivos das despesas com a educação e com a saúde. No entender do ideário liberal assim aplicado, as poupanças resultantes da redução dos custos do trabalho e da diminuição dos impostos, conduziriam ao aumento dos lucros e dos investimentos e, portanto, ao crescimento económico.

Na prática, sabe-se que a única coisa que, garantidamente, cresce com a aplicação deste programa é o fosso que separa os mais ricos dos mais pobres.

Ricardo Rio é o candidato da coligação PSD-CDS-PPM à Câmara Municipal de Braga. Pode alguém que se apresenta como defensor do programa neoliberal de Passos Coelho ser um bom Presidente camarário? Existem pessoas que consideram que não existe qualquer relação entre uma coisa e outra. Não é essa a minha opinião. Em Braga, como em todos o país, o maior problema com que nos defrontamos é o desemprego, neste caso largamente acentuado pela crise da construção civil. À CMB compete, compete, na medida das suas possibilidades, tomar medidas que permitam combatê-lo. Para isso, podemos confiar em alguém que é militante do PSD e apoiante de um governo que, desde a sua tomada de posse destrui quase meio milhão de postos de trabalho e que promete prosseguir nessa senda enviando, proximamente, para o desemprego mais umas dezenas de milhares de trabalhadores da função pública?

Uma vitória de Ricardo Rio, e sobretudo uma vitória com maioria absoluta, numa autarquia que representa a terceira maior capital de distrito, seria “cantada” por Passos Coelho como mais um voto de confiança do eleitorado nas políticas prosseguidas pelo seu governo. E seria, de facto, mais um balão de oxigénio, oferecido a um governo que luta afanosamente pela sua sobrevivência.

Será que aqueles que exigem nas ruas a sua demissão podem dar-se ao luxo de lhe prestar esse favor?

domingo, 2 de junho de 2013



A oeste, nada de novo


Como se sabe, as últimas previsões da OCDE anunciam uma recessão mais grave do que aquela que o governo previa e, consequentemente, um agravamento do défice superior ao esperado. O governo desvaloriza-as mas, pelo sim pelo não, ensaia uma mudança de discurso e Vítor Gaspar diz-nos que chegou “a hora do investimento”. Entretanto, o Orçamento Rectificativo que vai ser apresentado na AR na próxima semana promete despedimentos e cortes salariais na função púbica, cortes nas pensões pagas pela CGA e cortes nos subsídios de desemprego. Ou seja, mais medidas de austeridade com um inevitável efeito recessivo. Mais desemprego, mais pobreza. Enfim, encerram-se mais postos dos Correios, perante a revolta das populações afectadas, mas tornando-os ainda mais apetecíveis para aqueles que se preparam para a sua privatização.

Entretanto, sob o patrocínio de Mário Soares, as esquerdas reuniram-se na Aula Magna para exigir o fim da austeridade. Podia ser um passo importante para a criação de uma alternativa ao governo PSD/CDS. Mas não foi. As ausências de António José Seguro e de Jerónimo de Sousa só podem ser interpretadas como um sinal de distanciamento do PS e do PCP e o maior empenhamento do Bloco não se traduziu num discurso que denotasse a vontade de ultrapassar velhos bloqueios.

Seguro não acredita na viabilidade de um governo das esquerdas e prefere apostar numa muito improvável maioria absoluta do PS ou numa aliança do seu partido com o CDS, que apenas nos traria mais do mesmo. Para Jerónimo, o problema do governo pode ser adiado para os longínquos “amanhãs que cantam”. Se se realizassem eleições antecipadas e se o PCP saísse delas com mais 4 ou 5 deputados, isso seria suficiente para poder cantar vitória. E o Bloco, incapaz de se decidir por uma aliança preferencial com o PS ou com o PCP, continua a bater-se, sem glória, pela quadratura do círculo.

Tudo na mesma, portanto. Os vários partidos da esquerda não se reuniram na Aula Magna para construir uma alternativa sobre aquilo que os poderia unir – a crítica das políticas de austeridade, a defesa do Estado social, a recusa da privatização de empresas públicas lucrativas ou prestadoras de serviços sociais básicos – mas apenas para marcar, mais uma vez, o seu próprio território.

Ontem, realizaram-se várias manifestações promovidas pelo movimento “Que se lixe a troika!”. Pouco participadas. Não, com certeza, porque os portugueses estejam conformados com a sua triste sorte, mas porque sabem que o tempo do protesto tem de dar lugar ao tempo da criação de uma alternativa. Precisamente, aquilo que podia ter começado a nascer na Aula Magna…

O que fazer, quando os anseios mais legítimos do “povo de esquerda” não encontram uma resposta na estratégia dos partidos que dizem representá-lo?