sexta-feira, 19 de julho de 2013

PSD / CDS: uma vitória previsível, mas uma vitória de Pirro




O apelo do Presidente da República a um entendimento entre os partidos que assinaram o memorando da troika só pode saldar-se por uma vitória dos partidos da direita. De facto, o PS viu-se numa situação da qual só pode sair perdedor. Se recusar um entendimento como o PSD e o CDS assumirá junto de uma opinião pública maioritariamente favorável a esse entendimento o papel do partido responsável pelo falhanço de um projecto de “salvação nacional”; se subscrever esse entendimento, fornecerá mais um balão de oxigénio a um governo que, apenas há quinze dias, parecia moribundo e contribuirá para reforçar a ideia de que, afinal, não há alternativa viável para além da prossecução das políticas de austeridade impostas pela troika. Em qualquer dos casos poderá ser penalizado nas próximas eleições, perdendo votos do centro para o PSD ou para o CDS, ou perdendo votos à esquerda para o PCP e para o Bloco.

Por outro lado, a vitória de Passos Coelho será necessariamente frágil e transitória. Na prática, o seu novo discurso acerca da necessidade de potencializar o crescimento económico, vai confrontar-se com as exigências de cortes de 4,7 mil milhões de euros nas despesas do Estado. Qualquer redução substancial desse montante terá de passar não só pelo acordo entre os três partidos envolvidos nas negociações promovidas por Cavaco Silva, mas sobretudo pela concordância da troika. Pequenas concessões significarão sempre cortes nas pensões de reforma, despedimentos na função pública, cortes na Saúde e na Educação, nos subsídios de desemprego e noutras prestações sociais. Significarão mais pobreza, mais recessão e mais desemprego. E, em última análise, um maior agravamento do défice da dívida pública.

Por não ser capaz de implementar este programa e de alcançar os resultados pretendidos, demitiu-se Vítor Gaspar. E, pelos mesmos motivos, o governo de Passos Coelho tem os dias contados. Mas, entretanto, com a ajuda de Cavaco Silva, o seu tempo de vida prolongar-se-á… Quando, finalmente, se for embora o país estará bem pior do que está hoje. Só então se fará uma avaliação exacta dos custos da “salvação nacional”.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

A crise política, a "solução" do PR e as tarefas da esquerda

Da comunicação ao País do Presidente da República, retiro 5 ideias fundamentais:

1. Este não é o momento ideal para convocar eleições antecipadas.
2. No entanto, elas deverão ocorrer depois de Julho de 2014 (fim do programa de assistência da troika).
3. Logo o governo CDS/PSD que lhe foi apresentado por Passos Coelho não serve e não deve chegar ao fim da legislatura (Junho de 2015).
4. Contudo, teremos que viver com ele até 7-14 aceitando-o como um "mal menor".
5. Entretanto, deverá avançar-se para um "acordo de salvação nacional" entre o PSD, o CDS e o PS que garanta a estabilidade política, o regresso aos mercados e a recuperação económica no período pós-troika,

Ou seja, Cavaco Silva defende duas coisas dificilmente conciliáveis: por um lado passa um atestado de incompetência a Passos Coelho e a Paulo Portas, por outro apela a a António José Seguro que se junte a esse grupo. Além disso, considera que a base desse entendimento continua a ser um memorando cuja aplicação tem estado na origem da situação desastrosa em que nos encontramos.

Posto isto, devo dizer que ouvi com agrado a comunicação feita por Alberto Martins em nome do PS:

1. O PS mantém-se na oposição ao governo CDS/PSD, agora recauchutado.
2. Não irá para o governo senão por vontade expressa dos portugueses expressa em eleições legislativas.
3. Discorda da tentativa de marginalização do PCP e do BE em qualquer processo negocial.

Os partidos da esquerda têm agora um ano para limar as divergências que os dividem e prepararem-se para apresentar soluções alternativas capazes de ganhar o apoio da maioria dos portugueses em futuras eleições antecipadas.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

ELEIÇÕES ANTECIPADAS?



“Senhor Presidente, respeite a vontade do povo e demita o governo” (Arménio Carlos na manifestação que, no último sábado, juntou cerca de 1.000 pessoas em frente do Palácio de Belém). Não faltam boas razões que justifiquem a sua declaração a favor de eleições antecipadas. Contudo, ela parte de um pressuposto que talvez esteja errado: segundo a sondagem publicada no Expresso, apenas 37,2% dos eleitores se pronunciam nesse sentido.

Os 36,6% que apoiam a continuidade de um governo PSD/CDS mais ou menos recauchutado corresponderão, talvez, ao apoio eleitoral dos partidos do governo. Socorro-me agora de uma outra sondagem, publicada no i, que dá 25,4% de intenções de voto ao PSD e 9,5% ao CDS. É, no entanto, bem provável que, depois da crise aberta pela demissão “irrevogável” de Paulo  Portas, estes números tenham que ser “revistos em baixa”.

Parto do princípio que Cavaco Silva dará posse ao novo governo. Como se sabe, há quem afirme que a posição do CDS no governo sairá reforçada após a remodelação que se anuncia. Não me parece que seja assim. A governação continuará a ser ditada pela troika e tem como programa fundamental o corte de 4.700 milhões de euros nas despesas do Estado (em salários, pensões e várias prestações sociais). As consequências recessivas da aplicação deste programa serão brutais e atirarão para as calendas quaisquer veleidades de aposta no crescimento económico. Ora, o “reforço” das responsabilidades do CDS no governo atam-no de pés e mãos à sua aplicação e inviabilizam qualquer possibilidade de “distanciamento crítico” de Paulo Portas.

O barco do governo vai ao fundo. Vítor Gaspar já saltou borda fora e Paulo Portas queria seguir-lhe as pisadas, mas Passos Coelho garantiu que, a partir de agora, toda a tripulação se afundaria com ele.

Voltemos à questão das eleições antecipadas. Por que é que o PCP insiste no tema, sabendo que, com toda a probabilidade, delas resultará uma vitória do PS? O novo acordo, que se pretende “sólido e abrangente”, assinado entre Passos Coelho e Paulo Portas veio inviabilizar definitivamente a possibilidade, acalentada por muitos socialistas, de um governo PS-CDS. E a recusa do PCP em estabelecer qualquer aliança como os socialistas condena António José Seguro a formar um governo frágil e minoritário que acabará por ficar manietado pelas imposições da troika. Ou seja, o PCP deseja eleições antecipadas para ver o PS consumir-se na fogueira que já reduziu o PSD a cinzas. Liquidados assim os partidos do bloco central, ficaria aberto o caminho para um governo liderado pelo PCP e apoiado pelos Verdes e “outras forças” sociais. A mim, este plano parece-me uma fantasia, mas convenhamos que na perspectiva dos comunistas faz todo o sentido.

Sendo assim, porque é que António José Seguro continua a defender as eleições antecipadas? Penso que a impopularidade crescente deste governo não lhe deixa alternativa, sob pena de ser acusado de contemporizar com o processo de destruição da economia, do emprego e do Estado Social em curso. Contudo, parece-me que se trata sobretudo de um recurso retórico. De facto, o PS aposta numa vitória eleitoral com maioria absoluta e a possibilidade desse desejo se concretizar será tanto maior quanto mais tarde cair o governo.

Evidentemente, há uma outra alternativa que passa por um acordo entre o PS e o BE. Mas também ela exige tempo para ser trabalhada. Não se compadece com a realização de eleições em Outubro.

Em conclusão. Há muitas e fortes razões para exigir eleições antecipadas, mas falta ainda um “pequeno detalhe” – uma alternativa credível ao governo actual. Não será por isso que só 37,2% dos eleitores consultados pela Euroexpansão se pronunciam a seu favor?

quarta-feira, 3 de julho de 2013

A presente crise política e a revisão da lei eleitoral



O fim da coligação PSD-CDS abriu uma crise política que exige a convocação de eleições antecipadas. Isso é uma condição necessária para o aparecimento de uma alternativa política ao governo de Passos Coelho, mas não é uma condição suficiente. Receio bem que estejamos perante uma situação em que a direita já não é capaz de governar, mas a esquerda ainda não é capaz de o fazer. O caldo habitual donde já nasceram muitas soluções bonapartistas.

Não creio que, nos próximos meses, o PS, o PCP e o BE sejam capazes de ultrapassar as divergências que bloqueiam a possibilidade de formação de um governo de esquerda. E, nesse caso, provavelmente, das próximas eleições sairá um governo minoritário liderado por António José Seguro, pontualmente apoiado pelo CDS e manietado pelas exigências da Comissão Europeia.

Repetir experiências passadas, mudando de governantes sem mudar de políticas, pode ter um efeito devastador sobre o actual sistema político-partidário e mesmo sobre a confiança dos portugueses nos mecanismos da democracia representativa.

Prevenir a possibilidade de que o aprofundar da crise económica dê origem a uma tentação totalitária parece-me que, hoje, deve ser uma preocupação central de todos os democratas. Os partidos actualmente existentes estão reféns de lógicas de auto-afirmação que resultam apenas da vontade de satisfazer os interesses e anseios das suas redes clientelares e parecem cada vez menos capazes de ouvir os cidadãos comuns. Sendo assim, a defesa do regime democrático terá que passar necessariamente pela possibilidade destes fazerem ouvir a sua voz no seio do parlamento sem serem obrigados a sujeitar-se a uma intermediação partidária.

Na minha opinião, o parlamento que sair das próximas eleições legislativas deve ter na sua agenda a revisão da lei eleitoral, abrindo-a à possibilidade da apresentação de candidaturas independentes ao cargo de deputado. Penso que isso implicaria o aparecimento de círculos uninominais, onde o eleitorado seria chamado a votar em candidatos apresentados ou não pelos partidos, sendo eleito aquele que reunir um maior número de votos. Sabe-se que este sistema tem a desvantagem de distorcer gravemente a proporcionalidade entre os votos recebidos pelos diferentes partidos e o número de deputados que estes são capazes de eleger. Na prática, pode saldar-se pela eliminação dos partidos mais pequenos e, consequentemente, num empobrecimento da representatividade do parlamento. Contudo, isto pode ser contrariado pela criação de um círculo nacional, onde se apresentariam listas partidárias cujos candidatos seriam eleitos de acordo com a percentagem de votos obtida.

Por exemplo, numa AR formada por 200 deputados, 100 seriam eleitos em círculos uninominais e os restantes no círculo nacional. Num sistema de proporcionalidade directa, um pequeno partido que não conseguisse vencer em nenhum círculo uninominal, mas obtivesse, digamos, 8% dos votos no círculo nacional, elegeria 8 deputados.

Num cômputo final, teríamos um parlamento formado por deputados dos maiores partidos, por deputados de partidos mais pequenos e por deputados independentes. Penso que se conseguiria assim uma representação mais rica e diversificada do parlamento, e que se obrigaria os partidos (que continuariam a ter um papel fundamental no jogo democrático) a repensar a sua forma de se relacionarem com a sociedade civil, sob pena de sofrerem pesadas derrotas nos círculos uninominais.