“Senhor Presidente, respeite a vontade
do povo e demita o governo” (Arménio Carlos na manifestação que, no último
sábado, juntou cerca de 1.000 pessoas em frente do Palácio de Belém). Não
faltam boas razões que justifiquem a sua declaração a favor de eleições
antecipadas. Contudo, ela parte de um pressuposto que talvez esteja errado:
segundo a sondagem publicada no Expresso, apenas 37,2% dos eleitores se
pronunciam nesse sentido.
Os 36,6% que apoiam a continuidade de
um governo PSD/CDS mais ou menos recauchutado corresponderão, talvez, ao apoio
eleitoral dos partidos do governo. Socorro-me agora de uma outra sondagem,
publicada no i, que dá 25,4% de intenções de voto ao PSD e 9,5% ao CDS. É, no
entanto, bem provável que, depois da crise aberta pela demissão “irrevogável”
de Paulo Portas, estes números tenham
que ser “revistos em baixa”.
Parto do princípio que Cavaco Silva
dará posse ao novo governo. Como se sabe, há quem afirme que a posição do CDS
no governo sairá reforçada após a remodelação que se anuncia. Não me parece que
seja assim. A governação continuará a ser ditada pela troika e tem como programa fundamental o corte de 4.700 milhões de
euros nas despesas do Estado (em salários, pensões e várias prestações sociais).
As consequências recessivas da aplicação deste programa serão brutais e
atirarão para as calendas quaisquer veleidades de aposta no crescimento
económico. Ora, o “reforço” das responsabilidades do CDS no governo atam-no de
pés e mãos à sua aplicação e inviabilizam qualquer possibilidade de
“distanciamento crítico” de Paulo Portas.
O barco do governo vai ao fundo. Vítor
Gaspar já saltou borda fora e Paulo Portas queria seguir-lhe as pisadas, mas
Passos Coelho garantiu que, a partir de agora, toda a tripulação se afundaria
com ele.
Voltemos à questão das eleições
antecipadas. Por que é que o PCP insiste no tema, sabendo que, com toda a
probabilidade, delas resultará uma vitória do PS? O novo acordo, que se
pretende “sólido e abrangente”, assinado entre Passos Coelho e Paulo Portas
veio inviabilizar definitivamente a possibilidade, acalentada por muitos
socialistas, de um governo PS-CDS. E a recusa do PCP em estabelecer qualquer
aliança como os socialistas condena António José Seguro a formar um governo frágil
e minoritário que acabará por ficar manietado pelas imposições da troika. Ou
seja, o PCP deseja eleições antecipadas para ver o PS consumir-se na fogueira
que já reduziu o PSD a cinzas. Liquidados assim os partidos do bloco central,
ficaria aberto o caminho para um governo liderado pelo PCP e apoiado pelos
Verdes e “outras forças” sociais. A mim, este plano parece-me uma fantasia, mas
convenhamos que na perspectiva dos comunistas faz todo o sentido.
Sendo assim, porque é que António José
Seguro continua a defender as eleições antecipadas? Penso que a impopularidade
crescente deste governo não lhe deixa alternativa, sob pena de ser acusado de
contemporizar com o processo de destruição da economia, do emprego e do Estado
Social em curso. Contudo, parece-me que se trata sobretudo de um recurso
retórico. De facto, o PS aposta numa vitória eleitoral com maioria absoluta e a
possibilidade desse desejo se concretizar será tanto maior quanto mais tarde
cair o governo.
Evidentemente, há uma outra
alternativa que passa por um acordo entre o PS e o BE. Mas também ela exige
tempo para ser trabalhada. Não se compadece com a realização de eleições em
Outubro.
Em conclusão. Há muitas e fortes
razões para exigir eleições antecipadas, mas falta ainda um “pequeno detalhe” –
uma alternativa credível ao governo actual. Não será por isso que só 37,2% dos
eleitores consultados pela Euroexpansão se pronunciam a seu favor?