sábado, 11 de julho de 2009

Algumas ideias sobre arte e política




Em política, “dizer é fazer” (Austin). Lawrence Weiner, Pearls rolled across the floor, 1994. Não é possível ler sem ver. Então será realmente necessário mostrar as pérolas que rolavam pelo chão?

A leitura da frase sugere-nos imediatamente uma imagem mental, não precisamos de nos apoiar na percepção de uma pintura que a descreva. De facto, a sua ausência libertou-nos, deixamos de estar subjugados pela pintura para passarmos a ser como que co-autores da imagem sugerida pelo artista. A obra de arte passou também a ser “nossa” e, para isso, não foi preciso comprá-la.

O exemplo dos ready made de Marcel Duchamp mostrou que qualquer objecto, independentemente da sua qualidade formal, poderia ser considerado uma obra de arte. Aquilo que interessa não é a sua aparência visual, mas a intenção declarada do artista; não o produto físico de uma acção, mas a própria acção.

Nos anos 60, começa a criticar-se a obra de arte entendida como um objecto único e irrepetível, dotado de uma “aura” (Walter Benjamin) que lhe conferia uma particular valia simbólica. No quadro de uma sociedade capitalista, isso traduzia-se num alto valor mercantil. Critica-se, portanto, a obra de arte como um objecto de luxo burguês. Surgiram, assim, uma série de movimentos que preferiram o happening, a body art ou a land art à pintura e à escultura. Produziram-se obras que não podiam ser conservadas, a não ser sob a forma de memórias, fotografias, filmes ou escritos que documentavam a sua ocorrência. A obra de arte perdeu a sua “aura” na medida em que só podemos possuí-la sob a forma de registos mecanicamente reproduzidos. E, neste sentido, deixou de se afirmar como um objecto de culto (do culto da arte), para se transformar num acto político. Podemos dizer que passamos do conceito de objecto artístico para o de actividade artística, pelo que muitas destas obras cabem na designação genérica de process art.

Num sentido lato, podemos situar a process art no quadro da arte conceptual. Num sentido mais estrito, empregamos esse termo para referir a obra dos artistas que adoptaram uma linha linguística e analítica que se desenvolveu a partir dos anos 60, num contexto anglo-saxónico. A sua referência fundamental é, mais uma vez, Marcel Duchamp. Um vulgar urinol transformou-se numa obra de arte porque o artista o denominou como tal. Duchamp baptizou um objecto vulgar como objecto artístico e isso foi suficiente para que ele se transfigurasse em tal. “Baptizar” é dar um nome e chamar a um urinol Fountain é criar uma obra de arte.

Retirando daí todas as conclusões, surgiram artistas que realizaram obras que não eram mais do que textos escritos. Na medida em que uma obra de arte é aquilo que se apresenta como tal, então cada uma delas é uma definição em acto do conceito de “arte”. E, sendo assim, a sua finalidade será a de explicitar na prática a qualidade desta definição, necessariamente tautológica.

Pearls rolled across the floor é uma resposta a uma questão fundamental: o que é uma obra de arte? Quanto a este pequeno texto, pretende responder a uma outra: por que é que Pearls rolled across the floor resulta dum acto político e é não um simples facto “estético”?

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