sábado, 26 de outubro de 2013



NÃO HÁ BECOS SEM SAÍDA!

1.  Considerando que a política de austeridade que tem sido adoptada pelo governo, falhou (o défice em percentagem do PIB é hoje muito maior do que aquele que tínhamos antes do programa de resgate e os juros pagos pelos títulos de dívida pública, transaccionados no mercado secundário, estão ao nível de 2010),

2.    e considerando que todos os sacrifícios, entretanto realizados (crescimento gigantesco do desemprego e da pobreza), se revelaram inúteis,

3.    concluímos que o combate à crise requer uma mudança radical de orientação política.

QUE SAÍDAS TEMOS À DISPOSIÇÃO?
1.   
  A solução que tem sido repetidamente avançada por diferentes sectores da oposição consiste na renegociação da dívida. Na sua versão mais radical e, na opinião de alguns, mais justa e realista, trata-se de renegociar montantes, juros e prazos. Ou seja, da sua reestruturação.

2Uma renegociação da dívida implica um acordo entre credores e devedores. A sua concretização não depende apenas de nós. Consideremos aqui duas hipóteses:

1.       Verifica-se um acordo entre as partes. Aspectos positivos: libertam-se capitais necessários ao relançamento económico e poderíamos, talvez, esperar uma relativa melhoria das condições de vida da população. Aspectos negativos: um haircut significativo afastar-nos-ia da possibilidade de regresso aos mercados financeiros e, portanto, continuaríamos dependentes dos empréstimos da Troika e, portanto, sob a sua supervisão.

2.       Não se verifica um acordo entre as partes. Nesse caso, ou nos mantemos numa situação aproximadamente igual á que temos hoje, ou denunciamos unilateralmente o pagamento da dívida, o que implicará a interrupção das transferências acordadas com a Troika.

3.    Neste último caso, só nos resta uma solução para conseguirmos os meios necessários para garantir o pagamento de salários e pensões e de outras despesas inerentes ao funcionamento das instituições públicas: a emissão de moeda própria 
.
CONCLUSÃO

1.    Na actual conjuntura política europeia, um acordo com a Troika acerca da reestruturação da dívida só poderá ser conseguido se esta for confrontada com a ameaça de um cancelamento unilateral dos pagamentos e consequente saída do euro.

Ou seja, se os nossos credores considerarem que, apesar da suas perdas, a reestruturação é, do seu ponto de vista, um mal menor.

2.    Se ainda assim, esse acordo não se verificar, restar-nos-á negociar as melhores condições possíveis da nossa retirada da zona euro.

3.    Um acordo acerca da reestruturação da dívida não nos libertaria de supervisão da Troika e de uma renegociação permanente dos termos inerentes aos novos empréstimos que teríamos que contrair no futuro. A saída do euro implicará, por certo, sacrifícios cuja gravidade é, neste momento, difícil de prever, mas é a única solução que nos poderia devolver direitos de soberania entretanto perdidos.

DUAS NOTAS FINAIS

1.   A solução de um regresso aos mercados sustentada pelo compromisso de aquisição pelo BCE, no mercado secundário, de títulos de dívida pública emitidos pelo Estado português, de forma a evitar uma subida incomportável dos seus juros, não seria radicalmente diferente de um programa de resgate, na medida em que esse compromisso só se efectivará como garantia a prossecução das actuais políticas austeritárias. Além disso, passaríamos a pagar juros mais altos do que aqueles que pagamos hoje pelos empréstimos obtidos.

A solução que passa pela mutualização da dívida pública ou, pelo menos, de parte dela, conta com a forte oposição dos países do norte da UE e, em particular, da Alemanha e não é previsível que essa posição venha a ser alterada a curto prazo. Além disso, mesmo que alguns desses países venham, a médio prazo, a mudar a sua opinião, isso passaria necessariamente pela evolução da UE no sentido do federalismo, o que seria sempre inaceitável para o Reino Unido e mesmo para outros países onde uma opinião pública eurocéptica tem vindo a ganhar uma força crescente.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Braga - Por que foi derrotada a candidatura da “Cidadania em Movimento”?




Dos muitos contactos que fui tendo com candidatos da CEM, fiquei com a ideia de que esta candidatura independente se propunha alcançar dois objectivos eleitorais: 1º - eleger um vereador; 2º - evitar a formação de um executivo camarário apoiado numa maioria absoluta. Como se sabe, nenhum deles foi alcançado.

E, no entanto, a CEM poderia ter obtido um óptimo resultado nas eleições autárquicas de Braga. Conseguiu unir muitos independentes que se encontravam mais ou menos afastados de uma participação política activa e ainda personalidades relevantes oriundos da área política do PS, do BE e do PCP. Além disso, beneficiou de uma posição crítica, cada vez mais acentuada de uma grande parte da população bracarense em relação à presidência de Mesquita Machado na CMB, bem como do descrédito dos partidos comprometidos com o governo de Passos Coelho que sustentavam a candidatura de Ricardo Rio.

A legalização da candidatura autárquica da CEM, com a recolha num espaço relativamente curto de tempo, de perto de 5.000 assinaturas apareceu como uma lufada de ar fresco no ambiente bafiento da política autárquica bracarense.

Sendo assim, penso que os resultados obtidos (5.032 votos para a Câmara e 6.743 votos para a Assembleia Municipal) ficaram muito aquém daquilo que se esperava. Importa reflectir sobre esta derrota. Na minha opinião, ela prende-se quer com o programa eleitoral que foi apresentado, quer com a estratégia política adoptada.

O programa eleitoral pecou, antes de mais, por desprezar qualquer hierarquização das propostas apresentadas. Num momento de grave crise social deveria, ter-se centrado em duas questões fundamentais – na luta conta a pobreza e na luta contra o desemprego, ou seja, na acção social e na reabilitação urbana, Nestas duas matérias era necessário apresentar propostas muito concretas e exequíveis no curto prazo. Nomeadamente, propostas cuja realização passasse pelo investimento público. Contudo, nenhuma destas questões mereceu qualquer destaque no programa e na propaganda da CEM.

Em vez disso, foi apresentado um programa onde algumas propostas importantes se perdiam no meio de muitas outras igualmente justas, mas de interesse mais secundário ou de outras ainda, pouco viáveis ou simplesmente fantasiosas. Assim, quando um eleitor perguntava – “o que a CEM defende?” – era impossível dar-lhe, em poucas palavras, uma resposta clara.

Como estratégia política adoptou-se um “pacto de não agressão” com a candidatura de Ricardo Rio: nós não vos criticamos a vocês e vocês não nos criticam a nós mas, pelo contrário, convergimos ambos na crítica à candidatura de Vítor Sousa. Desta forma, a CEM apareceu aos olhos de muitos eleitores como uma candidatura colada à direita mais reaccionária que alguma vez governou Portugal desde o 25 de Abril. Sei que isso não expressa o pensamento político dos seus candidatos. Mas, em política, “o que parece é” e aquela imagem impôs-se de tal maneira, que bloqueou qualquer hipótese de crescimento à esquerda. Assim, a CEM foi recolhendo simpatias entre um eleitorado que, por fim, votou “útil” em Ricardo Rio e isolou-se de um eleitorado que queria utilizar as autárquicas para penalizar o governo.

Os resultados finais mostram que quem beneficiou desta estratégia suicidária foi a CDU que, apesar do seu tradicional sectarismo, conseguiu captar o voto de um eleitorado que a CEM resolveu abandonar e conseguiu eleger um vereador.

Enfim, uma estratégia de branqueamento da candidatura de Ricardo Rio (cuja eventual vitória foi sendo sempre considerada como um “mal menor”) deu no que deu: numa maioria absoluta da direita e na não eleição de Inês Barbosa. A eleição de dois deputados para a Assembleia Municipal é, neste contexto, um triste prémio de consolação.

Posto isto, espero bem que “com a água suja do banho, não se lance fora a criança”. O apelo a uma maior participação da sociedade civil no governo da cidade é uma ideia lançada pela CEM que deve continuar a ser acarinhada e o aparecimento de uma candidatura independente, não subordinada a egoísmos partidários, pode ser um instrumento importante para um necessário reforço da democracia participativa. Esperemos que a acção da CEM prossiga e se centre cada vez mais na auscultação dos problemas efectivamente sentidos pela população bracarense e no seu envolvimento com vista à sua resolução.

Uma última palavra acerca da “ideia de cidade” cuja discussão informou poderosamente a elaboração do programa da CEM. Penso que o ponto de partida para essa discussão deveria ter sido o reconhecimento de que vivemos numa sociedade pluralista, onde coexistem diferentes ideias acerca do que é uma “vida boa”. Não compete a um grupo de intelectuais, mais ou menos iluminados, idealizar uma cidade a partir do seu entendimento acerca de como devemos todos viver, mas sim defender uma “ideia de cidade” que permita a cada um a realização dos seus diferentes projectos pessoais.

sexta-feira, 19 de julho de 2013

PSD / CDS: uma vitória previsível, mas uma vitória de Pirro




O apelo do Presidente da República a um entendimento entre os partidos que assinaram o memorando da troika só pode saldar-se por uma vitória dos partidos da direita. De facto, o PS viu-se numa situação da qual só pode sair perdedor. Se recusar um entendimento como o PSD e o CDS assumirá junto de uma opinião pública maioritariamente favorável a esse entendimento o papel do partido responsável pelo falhanço de um projecto de “salvação nacional”; se subscrever esse entendimento, fornecerá mais um balão de oxigénio a um governo que, apenas há quinze dias, parecia moribundo e contribuirá para reforçar a ideia de que, afinal, não há alternativa viável para além da prossecução das políticas de austeridade impostas pela troika. Em qualquer dos casos poderá ser penalizado nas próximas eleições, perdendo votos do centro para o PSD ou para o CDS, ou perdendo votos à esquerda para o PCP e para o Bloco.

Por outro lado, a vitória de Passos Coelho será necessariamente frágil e transitória. Na prática, o seu novo discurso acerca da necessidade de potencializar o crescimento económico, vai confrontar-se com as exigências de cortes de 4,7 mil milhões de euros nas despesas do Estado. Qualquer redução substancial desse montante terá de passar não só pelo acordo entre os três partidos envolvidos nas negociações promovidas por Cavaco Silva, mas sobretudo pela concordância da troika. Pequenas concessões significarão sempre cortes nas pensões de reforma, despedimentos na função pública, cortes na Saúde e na Educação, nos subsídios de desemprego e noutras prestações sociais. Significarão mais pobreza, mais recessão e mais desemprego. E, em última análise, um maior agravamento do défice da dívida pública.

Por não ser capaz de implementar este programa e de alcançar os resultados pretendidos, demitiu-se Vítor Gaspar. E, pelos mesmos motivos, o governo de Passos Coelho tem os dias contados. Mas, entretanto, com a ajuda de Cavaco Silva, o seu tempo de vida prolongar-se-á… Quando, finalmente, se for embora o país estará bem pior do que está hoje. Só então se fará uma avaliação exacta dos custos da “salvação nacional”.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

A crise política, a "solução" do PR e as tarefas da esquerda

Da comunicação ao País do Presidente da República, retiro 5 ideias fundamentais:

1. Este não é o momento ideal para convocar eleições antecipadas.
2. No entanto, elas deverão ocorrer depois de Julho de 2014 (fim do programa de assistência da troika).
3. Logo o governo CDS/PSD que lhe foi apresentado por Passos Coelho não serve e não deve chegar ao fim da legislatura (Junho de 2015).
4. Contudo, teremos que viver com ele até 7-14 aceitando-o como um "mal menor".
5. Entretanto, deverá avançar-se para um "acordo de salvação nacional" entre o PSD, o CDS e o PS que garanta a estabilidade política, o regresso aos mercados e a recuperação económica no período pós-troika,

Ou seja, Cavaco Silva defende duas coisas dificilmente conciliáveis: por um lado passa um atestado de incompetência a Passos Coelho e a Paulo Portas, por outro apela a a António José Seguro que se junte a esse grupo. Além disso, considera que a base desse entendimento continua a ser um memorando cuja aplicação tem estado na origem da situação desastrosa em que nos encontramos.

Posto isto, devo dizer que ouvi com agrado a comunicação feita por Alberto Martins em nome do PS:

1. O PS mantém-se na oposição ao governo CDS/PSD, agora recauchutado.
2. Não irá para o governo senão por vontade expressa dos portugueses expressa em eleições legislativas.
3. Discorda da tentativa de marginalização do PCP e do BE em qualquer processo negocial.

Os partidos da esquerda têm agora um ano para limar as divergências que os dividem e prepararem-se para apresentar soluções alternativas capazes de ganhar o apoio da maioria dos portugueses em futuras eleições antecipadas.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

ELEIÇÕES ANTECIPADAS?



“Senhor Presidente, respeite a vontade do povo e demita o governo” (Arménio Carlos na manifestação que, no último sábado, juntou cerca de 1.000 pessoas em frente do Palácio de Belém). Não faltam boas razões que justifiquem a sua declaração a favor de eleições antecipadas. Contudo, ela parte de um pressuposto que talvez esteja errado: segundo a sondagem publicada no Expresso, apenas 37,2% dos eleitores se pronunciam nesse sentido.

Os 36,6% que apoiam a continuidade de um governo PSD/CDS mais ou menos recauchutado corresponderão, talvez, ao apoio eleitoral dos partidos do governo. Socorro-me agora de uma outra sondagem, publicada no i, que dá 25,4% de intenções de voto ao PSD e 9,5% ao CDS. É, no entanto, bem provável que, depois da crise aberta pela demissão “irrevogável” de Paulo  Portas, estes números tenham que ser “revistos em baixa”.

Parto do princípio que Cavaco Silva dará posse ao novo governo. Como se sabe, há quem afirme que a posição do CDS no governo sairá reforçada após a remodelação que se anuncia. Não me parece que seja assim. A governação continuará a ser ditada pela troika e tem como programa fundamental o corte de 4.700 milhões de euros nas despesas do Estado (em salários, pensões e várias prestações sociais). As consequências recessivas da aplicação deste programa serão brutais e atirarão para as calendas quaisquer veleidades de aposta no crescimento económico. Ora, o “reforço” das responsabilidades do CDS no governo atam-no de pés e mãos à sua aplicação e inviabilizam qualquer possibilidade de “distanciamento crítico” de Paulo Portas.

O barco do governo vai ao fundo. Vítor Gaspar já saltou borda fora e Paulo Portas queria seguir-lhe as pisadas, mas Passos Coelho garantiu que, a partir de agora, toda a tripulação se afundaria com ele.

Voltemos à questão das eleições antecipadas. Por que é que o PCP insiste no tema, sabendo que, com toda a probabilidade, delas resultará uma vitória do PS? O novo acordo, que se pretende “sólido e abrangente”, assinado entre Passos Coelho e Paulo Portas veio inviabilizar definitivamente a possibilidade, acalentada por muitos socialistas, de um governo PS-CDS. E a recusa do PCP em estabelecer qualquer aliança como os socialistas condena António José Seguro a formar um governo frágil e minoritário que acabará por ficar manietado pelas imposições da troika. Ou seja, o PCP deseja eleições antecipadas para ver o PS consumir-se na fogueira que já reduziu o PSD a cinzas. Liquidados assim os partidos do bloco central, ficaria aberto o caminho para um governo liderado pelo PCP e apoiado pelos Verdes e “outras forças” sociais. A mim, este plano parece-me uma fantasia, mas convenhamos que na perspectiva dos comunistas faz todo o sentido.

Sendo assim, porque é que António José Seguro continua a defender as eleições antecipadas? Penso que a impopularidade crescente deste governo não lhe deixa alternativa, sob pena de ser acusado de contemporizar com o processo de destruição da economia, do emprego e do Estado Social em curso. Contudo, parece-me que se trata sobretudo de um recurso retórico. De facto, o PS aposta numa vitória eleitoral com maioria absoluta e a possibilidade desse desejo se concretizar será tanto maior quanto mais tarde cair o governo.

Evidentemente, há uma outra alternativa que passa por um acordo entre o PS e o BE. Mas também ela exige tempo para ser trabalhada. Não se compadece com a realização de eleições em Outubro.

Em conclusão. Há muitas e fortes razões para exigir eleições antecipadas, mas falta ainda um “pequeno detalhe” – uma alternativa credível ao governo actual. Não será por isso que só 37,2% dos eleitores consultados pela Euroexpansão se pronunciam a seu favor?