terça-feira, 2 de março de 2010


Livros – Apontamentos à margem

John le Carré, A Gente de Smiley. Lisboa: Dom Quixote, 2009

Os “motivos de força maior” que me mantiveram durante uns tempos afastado do computador não me separaram dos livros. Por exemplo, tive a oportunidade de reler A Gente de Smiley. A edição de bolso da Europa-América (que agora só conseguiria ler com o auxílio de uma lupa), substituída pela edição recente da Dom Quixote, valorizada por um interessante Prefácio do autor.

É dele que retiro esta observação a propósito da luta entre os serviços de informação dos dois blocos no contexto da Guerra Fria. Jonh le Carré descreve-o como sendo “o mais estéril, o menos produtivo e o mais viciante de todos os jogos que os espiões disputam, visto que não esclarece nem beneficia o mundo real que lhes dá o pão de cada dia e transforma o ofício da espionagem, basicamente muito simples, num interminável labirinto de espelhos ao qual só os profissionais têm acesso, e ninguém parece ganhar nada com isso”. Pelo contrário, um dos seus resultados mais evidentes é “a corrupção moral que a Guerra Fria deixava na sua esteira, tanto no mundo ocidental como no mundo comunista” (p. 10).

Já aqui fiz referência nuns “apontamentos à margem” do último romance de Jonh le Carré, Um Homem Muito Procurado, para o pendor moralizante que informa toda a sua obra. A qualidade literária e a mestria da narrativa não serão surpresa para ninguém.


Razões mais subjectivas levam-me a concluir com mais uma citação: “Hoje, porém, ao perscrutar calmamente o seu coração, Smiley percebeu que não era liderado, e talvez fosse mesmo iliderável; que as únicas restrições que se lhe impunham eram as da sua própria razão e a da sua própria humanidade (…). Investi a minha vida em instituições – pensou sem rancor – e a única coisa que me resta sou eu próprio” (p. 201).

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