Na morte de Eric Rohmer
Morreu anteontem Eric Rohmer. Embora não tenha os seus últimos filmes entre os meus favoritos (pude ver A Inglesa e o Duque (2001), O Agente Triplo (2004) e Os Amores de Asrtée e Céladon (2007); julgo que Le Canapé Rouge não chegou a ser exibido em Portugal), revisito com regularidade e sempre deliciado outros mais antigos. Em Portugal, já foi editada em DVD a série completa do Contos Morais e a dos Contos das Quatro Estações. Espero agora, ansiosamente, pela edição dos filmes da série Comédias e Provérbios. Talvez um dia, se a direcção da Velha-a-Branca estiver para aí virada, possa organizar aí a projecção de alguns deles…
Entretanto, reli um pequeno comentário escrito por mim há mais de um ano (para a gaveta, ainda não existia este blogue), a propósito da possibilidade da constituição de um novo partido que, em França, seguisse as pisadas do Die Linke, na Alemanha. Tendo escrito antes desta uma posta sobre a morte de Daniel Bensaïd, pareceu-me que seria curioso dá-lo agora a conhecer uma vez que, de alguma forma, estabelece uma relação entre ambos. Uma relação irónica, é certo, mas sempre vi na ironia um dos aspectos mais divertidos nos meus Rohmer preferidos...
Escrevia eu, em Janeiro de 2009, o seguinte:
Parece que está em discussão a possibilidade de constituição de um novo parido de esquerda em França. Não conheço pormenores, mas poderão estar envolvidos no processo a LCR, o PCF, dissidentes do PSF e outros grupos menos conhecidos.
Se bem conheço os franceses, não me parece enredo para um “filme de acção”. Estará mais próximo de um de Eric Rohmer. Imaginemos um labirinto. No centro do labirinto está um pedaço de queijo e, de fora dele, um rato. O ratito fareja o queijo e embrenha-se no labirinto, mas como é que há-de chegar ao petisco? Pensa na melhor solução, decide-se por um caminho, vai ter a um beco sem saída, volta para trás, experimenta um novo percurso… O tempo passa e, às vezes, com muita sorte, lá come o queijo. Na maior parte dos casos, desanimado, abandona o labirinto em jejum. Aquilo que querem as personagens de Rohmer não é um bocado de queijo: trata-se antes de chercher la femme. Mas, os caminhos que percorrem são igualmente tortuosos.
É que, ao contrário dos portugueses, que têm uma aversão considerável pelo pensamento abstracto, os franceses não conseguem mexer um dedo sem primeiro elaborar uma filosofia que o justifique. E, portanto, envolvem-se num labirinto teórico do qual, muitas vezes, só conseguem sair em jejum.
Como se sabe, não se vieram a formar um, mas dois novos partidos: o NPA, a partir da LCR, e o Parti de Gauche, formado por dissidentes do Partido Socialista. O PCF manteve a sua autonomia. E, ao contrário do que sucede com alguns dos filmes de Rohmer, nem terá chegado sequer a haver a atracção sentimental que a “filosofia” acabou por contrariar.
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