terça-feira, 28 de dezembro de 2010
quarta-feira, 22 de dezembro de 2010
domingo, 19 de dezembro de 2010
quinta-feira, 16 de dezembro de 2010
domingo, 12 de dezembro de 2010
quinta-feira, 9 de dezembro de 2010
terça-feira, 23 de novembro de 2010
segunda-feira, 22 de novembro de 2010
sábado, 13 de novembro de 2010
sexta-feira, 5 de novembro de 2010
sexta-feira, 29 de outubro de 2010
Quando as delegações chefiadas por Teixeira dos Santos e Eduardo Catroga se sentaram à mesa para negociar a possibilidade do PSD viabilizar o Orçamento de Estado proposto pelo governo estavam separadas por uma diferença de 1 milhão e trinta mil euros. Tratava-se de uma soma que o PSD pretendia retirar das receitas previstas pelo Orçamento do governo. Com o avanço das negociações, essa diferença foi reduzida para 230 milhões. E, nesse momento, a negociação foi abortada, ao que parece por iniciativa do governo.
Parece-me lícito perguntar se este tinha, de facto, a intenção de a levar até ao fim.
Do ponto de vista do PS, em princípio, seria conveniente arranjar um cúmplice com quem dividir as responsabilidades de um Orçamento que lançará o país para uma recessão económica e será causa de grandes sofrimentos sociais. Mas também podemos considerar outra hipótese: o PS poderá estar interessado em acusar o PSD de ser responsável por abrir uma crise política que agravaria a situação financeira em que nos encontramos e lançaria o país nas mãos do FMI. Realizar-se-iam eleições antecipadas e o PS transferia para o PSD a responsabilidade de governar o país sob a sua tutela. Regressaria ao poder mais tarde, aproveitando o inevitável desgaste de um governo liderado por um Passos Coelho, obrigado a tomar medidas que vão contradizer o seu actual discurso acerca do aumento dos impostos.
Do ponto de vista do PSD, não me parece interessante governar nestas condições. Haverá no seu seio quem pense que uma dieta de seis anos na oposição já é demais… No entanto, haverá outros que estarão na disposição de deixar o “trabalho sujo” para o PS e não se importem de esperar mais algum tempo. Mas, para isso, é fundamental que o Orçamento passe na AR.
Podemos, portanto, estar perante uma situação paradoxal: quem apresenta o Orçamento poderá estar interessado na sua reprovação, quem se lhe opõe gostaria de o ver viabilizado.
No cerne da questão, encontram-se contabilidades eleitorais que as sondagens vão ajudar a decidir. As mais recentes, da Marktest e da Universidade Católica, anunciam uma forte descida do PS e a vitória folgada do PSD. Alimentam, portanto, a impaciência daqueles que, no partido de Passos Coelho, apostam em regressar quanto antes ao poder e podem explicar o tom conciliatório do discurso de Sócrates em Bruxelas.
De uma uma coisa podemos estar certos: as divergências políticas entre os dois partidos do centro são de pouca monta (traduzem-se em 0,1% do PIB!) - ambos estão comprometidos com um programa de combate à crise que arrastará consigo a recessão económica, a asfixia financeira do Estado-providência, o aumento do desemprego e o crescimento da pobreza.
quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Recorde-se que Liu Xiaobo cumpre uma pena de prisão de onze anos por ter assinado a Carta 08, um documento onde se defendem direitos humanos básicos e a transição gradual e pacífica da China para a democracia. Na perspectiva do governo chinês é, portanto, um criminoso, e a atribuição do Nobel da Paz a um criminoso só pode ser entendida como uma “provocação”.
Pelos vistos o PCP, concorda com esta versão dos acontecimentos: manifestar uma opinião contrária à do governo chinês é um crime e premiar o criminoso com o Nobel deve ser entendido como um ataque à “solidariedade entre os povos”.
Sou obrigado a discordar. A solidariedade que devemos ao povo chinês passa pela defesa do seu direito à liberdade de expressão, de organização e de manifestação, passa pelo seu direito à liberdade sindical e à greve. Passa pelo apoio aos ideais democráticos que Liu Xiaobo defende.
E já agora: a luta dos operários chineses por condições dignas de trabalho não é dissociável da luta dos operários portugueses que perdem os seus postos de trabalho pela impossibilidade de muitas empresas portuguesas competirem com as importações que nos chegam da China a preços que só a mais violenta exploração capitalista tornam possíveis. Também para os operários portugueses Liu Xiaobo é um aliado.
sábado, 9 de outubro de 2010
Prever o futuro é sempre um exercício muito arriscado. Contudo, perante a situação de crise política que parece despontar no horizonte, é irresistível (e mesmo necessário) fazer alguns exercícios de futurologia.
Há semanas atrás, tudo indicava que o Orçamento de Estado que vai ser apresentado pelo governo passaria com a abstenção do PSD e os votos contra dos restantes partidos da oposição. Porém as diferentes posições defendidas por José Sócrates (ou por Teixeira dos Santos) e por Passos Coelho tornaram-se irredutíveis e a possibilidade do Orçamento ser reprovado na AR, parece aos olhos de muitos comentadores, ser agora ser agora provável.
Aceitemos então como hipótese que, apesar dos avisos de Durão Barroso, de Cavaco Silva e de Manuela Ferreira Leite, o PSD vai rejeitar o Orçamento. Consequências imediatas: José Sócrates demite-se e teremos eleições legislativas em Maio de 2011.
Não é fácil prever como é que o eleitorado vai reagir. Voltará a dar a vitória ao PS, apesar do desgaste provocado pelas medidas impopulares assumidas pelo governo? Vai penalizar Passos Coelho por provocar uma crise política que se vai somar, agravando-a, á crise económica e financeira que já vivemos? Em qualquer dos casos, julgo que nenhum dos dois partidos (nem o PSD somado ao CDS-PP) alcançará maioria absoluta.
Há cerca de um ano, escrevi aqui que o provável vencedor de futuras eleições antecipadas seria o FMI e volto, agora, a repeti-lo. As medidas agora propostas por Teixeira dos Santos (inclusive a subida de impostos que Passos Coelho parece recusar liminarmente) serão adoptadas pelo próximo governo, seja ele qual for, por imposição do FMI. Apenas serão adiadas por mais um ano.
Admitamos que o PSD ganha as eleições. José Sócrates, derrotado, abandonará a direcção do PS. Passos Coelho aceitará governar sujeito a uma política de austeridade imposta pelo FMI que vai reproduzir (e, provavelmente, agravar) aquela que justificou a abertura desta crise política?
Rejeitar o Orçamento por causa da subida dos impostos, parece-me, do ponto de vista de Passos Coelho, uma estratégia suicida. Ou perde as eleições antecipadas para José Sócrates ou, ganhando-as, perde-as para o FMI. Em qualquer dos casos, os impostos vão aumentar. E face a isto, só resta a Passos Coelho retirar-se da cena política.
Há uma outra hipótese: Passos Coelho tem consciência disso e, portanto, toda esta crispação em torno dos impostos não passa de um bluff. Uma jogada que visa apenas conseguir do Governo algumas pequenas cedências que permitam ao PSD abster-se sem perder totalmente a face.
Façamos, pois, um exercício de futurologia: aposto que uma posição “realista” acabará por predominar sobre uma disposição aventureira e o PSD segue o conselho de Manuela Ferreira Leite. Ainda assim, não menosprezemos a hipótese do “bom senso” ser derrotado pela ânsia de chegar ao poder a curto prazo, seja a que preço for, que domina uma boa parte do PSD…
domingo, 3 de outubro de 2010

Um ano depois, congela o investimento público, corta nos benefícios sociais, sobe o IVA para 23% e corta 5% na despesa com os vencimentos dos funcionários públicos e do sector empresarial do Estado. Nem Manuela Ferreira Leite tinha proposto tanto.
sexta-feira, 1 de outubro de 2010
Afinal o PEC 1 e o PEC 2 não resolveram o problema da nossa dívida externa. Pelo contrário, o Estado português tem emitido obrigações da dívida pública a juros cada vez mais elevados. A barreira dos 6% já foi largamente ultrapassada e ainda não se vê o fundo do túnel. Qual é a solução do Governo? Um PEC 3, agora sob a forma de um Orçamento de Estado. Ou seja, mais do mesmo mas em doses reforçadas: a redução da despesa pública vai incidir sobretudo em cortes na massa salarial da função pública e do sector empresarial do Estado e o aumento de receitas far-se-á principalmente através dum aumento do IVA para 23%.
Como os ordenados da função pública funcionam sempre como referência para a fixação dos ordenados de todos os assalariados e como a subida do IVA afecta indiscriminadamente todos os consumidores, antevê-se para os próximos tempos uma descida efectiva dos salários reais dos trabalhadores portugueses. A isto deve-se acrescentar, entre outras medidas, o congelamento de todas as pensões, tanto no sector público como no privado e a redução em 20% das despesas com o RSI.
Ninguém ignora que estas medidas resultarão numa redução significativa do poder de compra da grande maioria dos portugueses e que vão ter repercussões negativas sobre actividade comercial, bem como sobre a situação das empresas industriais que colocam os seus produtos no mercado interno. De facto, vão lançar-nos de novo numa grave situação recessiva. Os custos do PEC 3 traduzir-se-ão, portanto, num agravamento da condição económica dos sectores mais desfavorecidos da população e num aumento do desemprego.
Será que tudo é isto inevitável?
O Bloco tem defendido uma estratégia de combate à crise que passa pela defesa do poder de compra dos trabalhadores e pelo investimento público como forma de relançar do crescimento económico e combater o desemprego. Na sua opinião, o combate ao défice das contas públicas deveria fazer-se pelo combate ao despesismo do Estado e pelo aumento de impostos sobre o grande capital. Por isso opuseram-se ao PEC e, consequentemente, só podem votar contra a proposta de Orçamento que vai ser apresentada pelo PS. De resto, qualquer entendimento entre o BE e o PS não resultaria numa maioria parlamentar e o Orçamento seria reprovado no caso de todos os outros partidos votarem contra.
O PSD pretende que qualquer aumento de impostos é inaceitável e julga que o combate ao défice se pode fazer apenas pela diminuição da despesa. Por isso, não disse uma palavra contra a descida dos salários da função pública nem contra o congelamento das pensões.
O PS, pela voz de Teixeira dos Santos, já o desafiou a apresentar propostas concretas que permitam no curto prazo obter dessa forma os mesmos ganhos que resultam da subida do IVA.
Dentro de dezasseis dias a proposta de Orçamento elaborada pelo Governo chega à Assembleia da República. Entretanto, na televisão, os economistas de costume, preocupadíssimos com o défice e com as reacções dos mercados internacionais, vão criticar a subida de impostos, lamentar a ausência das sempre reclamadas "reformas estruturais" (leia-se: liberalização dos despedimentos e desmantelamento do estado-providência) e defender que os cortes salariais na função pública e nas prestações sociais deviam ter ocorrido mais cedo. Contudo, aqueles que sonhavam com uma intervenção do FMI já não precisam de se preocupar: a receita do Governo não é diferente daquela que ele preconizaria. Na rua, haverá quem tenha outras preocupações e outras ideias. Não se confunda a opinião pública com a opinião publicada.
quinta-feira, 23 de setembro de 2010
terça-feira, 21 de setembro de 2010
A discussão do OGE para 2011, que ainda não foi apresentado, tem dominado o debate político das últimas semanas.
Passos Coelho põe duas condições para o aprovar: não pode haver uma nova subida de impostos e são necessários mais cortes na despesa pública. Todos sentimos o peso da carga fiscal e todos temos conhecimento de muitos casos de desperdício de dinheiros públicos. Parece, portanto, ser uma proposta simpática, mas obrigar-nos a escolher entre mais impostos ou mais cortes na despesa pública coloca-nos perante um falso dilema.
Os mais ricos podem e devem pagar mais impostos. Aliás eximem-se muito facilmente a pagar aqueles a que estariam já obrigados pela legislação em vigor. Há deduções fiscais que põem todos os contribuintes a financiar o ensino privado e as clínicas particulares que são frequentadas apenas por aqueles que têm mais recursos. Seria bom pôr-lhes fim. E há investimento público positivo e necessário se pretendermos relançar a economia e combater o desemprego, embora concorde que, no contexto actual, o TGV não pode estar entre as nossas prioridades.
Por outro lado, o PEC II, aliás nascido dum acordo PS-PSD, atingiu fortemente os mais desfavorecidos quer no plano fiscal (com a subida do IVA, por ex.), quer nos no plano das prestações sociais (subsídio de desemprego, RSI, etc.) e é evidente que a redução da dívida pública não pode prosseguir por esse caminho. O agravamento das condições de vida da população portuguesa só pode atirar o país para a recessão económica, para o crescimento do desemprego, para a pobreza.
Não é possível ignorar que a dívida pública portuguesa continua a crescer e a meta dos 7,3% para 2010 apontada pelo PEC dificilmente será alcançada. A taxa do juro que pagamos sobre o financiamento externo bate recordes. Assoma o fantasma do incumprimento e quem nos empresta dinheiro está sobretudo preocupado com a possibilidade de não o poder reaver. O FMI está à porta.
Tanto no plano fiscal como no da redução da dívida pública há medidas urgentes que têm de ser tomadas. Mas nada disso nos permite escamotear que elas podem ser justas ou injustas, eficazes ou não. É sobre isto que o novo orçamento se tem de pronunciar. Agora, é Teixeira dos Santos quem tem a palavra. Aquilo que sabemos das opções tomadas no passado não nos deixa antever boas surpresas. E o facto do PSD ser, apesar das disputas mal-humoradas, o parceiro escolhido pelo governo para o viabilizar, também não.
Denunciar injustiças não chega. A esquerda só pode travar esta caminhada para o abismo se conquistar o apoio da opinião pública com propostas fundamentadas e viáveis no curto prazo. E só poderá defendê-las se souber criar as condições políticas necessárias à sua aplicação. O que é muito diferente de sonhar com situações ideais e ficar eternamente à espera de revoluções redentoras.
sábado, 11 de setembro de 2010
Férias, problemas de saúde e uma razoável preguiça têm-me afastado da escrita. Além disso, a actualidade política portuguesa, que tem sido o assunto dominante deste blog, parece-me um tema cada vez menos motivador. Os problemas de hoje são os de ontem e os de há muito tempo atrás. Os dirigentes e os comentadores políticos repetem-se. As pessoas comuns parecem oscilar entre o conformismo e uma revolta surda e, no fim, ainda que sem entusiasmo nem esperança de dias melhores, preparam-se para votar nos do costume.
O último inquérito de opinião da Eurosondagem (1-7 de Setembro) exemplifica o que acabamos de afirmar:
PS – 36%, PSD – 35,8%, CDS/PP – 8,4%, CDU – 7,7%, BE – 7,1%.
De resto se ninguém está satisfeito com o estado actual das coisas, também ninguém está disponível para abrir uma crise política da qual nada de substancialmente diferente sairia, a não ser, talvez, a penalização em termos de resultados eleitorais daqueles que ousem provocá-la. Aliás, entramos já nos últimos seis meses do mandato do PR que está, portanto, constitucionalmente impedido de dissolver a AR e convocar eleições.
Nestas circunstâncias, as disputas entre o PS e o PSD a propósito do Orçamento de Estado só podem ser desvalorizadas. É claro que Passos Coelho vai regatear até ao último minuto a abstenção do grupo parlamentar do PSD, tentando satisfazer minimamente os interesses do núcleo duro do seu eleitorado. Mas a Comissão Europeia não veria com bons olhos o chumbo do OGE, os nossos financiadores muito menos (será preciso recordar que o Estado se mantém à custa dos créditos obtidos lá fora?), Cavaco Silva já apelou a um entendimento e, em última análise, aquilo que vier a ser proposto decorrerá do PEC que o próprio PSD viabilizou.
O OGE será, portanto aprovado, a revisão constitucional não trará nada de novo, Sócrates continuará à frente do governo, a política imposta pelo PEC continuará a ditar as suas leis e, já agora, provavelmente, Cavaco Silva será reeleito. Entretanto, o desemprego bate recordes, a precariedade pesa como chumbo sobre os ombros dos jovens, a pobreza assenta arraiais. E muitos, como eu, esperam que surjam ideias novas que motivem o nascimento duma alternativa de esquerda.
quarta-feira, 25 de agosto de 2010
Livros – apontamentos à margem
Carlos Brito, Álvaro Cunhal, Sete fôlegos do combatente. Memórias. Lisboa: Edições Nelson de Matos, 2010
A propósito do PCP, é habitual salientar-se a “coerência”. Geralmente entende-se por isso a fidelidade intransigente a uma ortodoxia marxista-leninista (definida a partir do exemplo do PCUS) que informa a linha do partido pelo menos desde os anos 30 do século passado. Álvaro Cunhal teve um papel determinante na configuração ideológica do Partido e nenhum dos seus actuais dirigentes ousa pôr em causa esse legado. Contudo, os tempos que vivemos são outros e das mesmas ideias podem resultar consequências muito diversas.
As memórias de Álvaro Cunhal de Carlos Brito são muito interessantes a diversos títulos. Entre outras questões, permitem-nos seguir, a partir da análise dum espectador privilegiado, a evolução do PCP nas últimas décadas. Na minha opinião, pode retirar-se do livro de Carlos Brito a tese de que Álvaro Cunhal pensou sempre o PCP, mesmo durante o Fascismo, como um partido vocacionado para a tomada e o exercício do poder. Todas as suas opções tácticas eram determinadas por esse objectivo final. Com Jerónimo de Sousa, o PCP transformou-se num partido de protesto, desprovido duma orientação estratégica que tenha como alvo os mesmos objectivos.
Entendo por “esquerda de protesto” uma esquerda que pratica a denúncia sistemática e a luta contra as injustiças sociais, mas que se encontra fora da área do poder e que, portanto, se vê impedida de levar à prática políticas alternativas àquelas que são adoptadas pelo sucessivos governos a que se opõe. O PCP encontra-se hoje numa situação de isolamento político que o confina a esta condição e não se descobre na sua prática nada que indicie uma estratégia que vise contrariar este estado de coisas. Pelo contrário, parece conformado com esta situação. À sua volta não encontra aliados possíveis, mas apenas inimigos a abater. No seu próprio seio, uma onda de saneamentos e perseguições deixou claro o sinal de que nenhuma intenção renovadora seria tolerada.
É uma situação nova na longa história do partido. Álvaro Cunhal procurou sempre as alianças possíveis que evitassem o seu isolamento e permitissem situá-lo na área do poder. A estratégia definida no Rumo à Vitória apontava neste sentido. Uma revolução democrática e nacional poria fim ao fascismo. O passo seguinte seria a instauração duma democracia avançada capaz de promover a nacionalização dos monopólios e a reforma agrária. Essa democracia não devia (nem podia) confinar-se aos moldes das democracias ocidentais, mas deveria promover a transição para uma sociedade socialista. Em cada uma destas etapas o PCP estabeleceria as alianças necessárias e dispunha-se a fazer as concessões indispensáveis para que elas se efectivassem, sem nunca perder de vista o objectivo final da revolução. A intervenção do PCP na sequência do 25 de Abril e do 11 de Março está perfeitamente de acordo com esta estratégia. À aliança de todas as forças democráticas, segue-se a ruptura com Spínola e, depois, com Sá Carneiro e com Mário Soares. O PREC deveria avançar apoiado na aliança Povo-MFA. Mesmo quando, após o 25 de Novembro, o sucesso desta estratégia foi posto em causa, o PCP tentou, como assinala Carlos Brito, uma reaproximação a Melo Antunes e ao Grupo dos Nove com vista à defesa de algumas das posições anteriormente conquistadas. Mais tarde, encara a formação do PRD de Ramalho Eanes como uma forma de quebrar uma ameaça de isolamento a que o votava a ruptura com Soares. E, dará um apoio discreto à candidatura de Zenha à Presidência da República. Era importante não deixar que o partido fosse “encostado à parede” para poder continuar a influenciar as decisões do poder e defender as “conquistas da revolução”.
Contudo, o PCP estava já remetido para uma posição defensiva. A hipótese revolucionária estava comprometida. Cunhal sabe que já não tem muitos anos de vida e o descalabro da URSS e o enfraquecimento e descaracterização de muitos partidos comunistas fá-lo temer pelo fim do PCP.
Instala-se um complexo de fortaleza sitiada. A luta pela sobrevivência domina todas as preocupações. A revolução tinha sido vencida, as possibilidades esboçadas pelo Novo Impulso viram-se rapidamente abortadas e nenhuma estratégia alternativa àquela que tinha sido desenhada no Rumo à Vitória veio tomar-lhe o lugar.
O PCP passou á condição dum partido de protesto, com uma influência sindical significativa, mas cada vez mais incapaz de condicionar as decisões de quem governa. Até onde pode chegar um partido remetido para esta posição? Num contexto de crise e de grande sofrimento social, os 7,8% de votos conseguidos nas legislativas de 2009 têm sido confirmados pelas últimas sondagens (Eurosondagem de 1-6/7: 8%, Euroexpansão de 8-11/7: 6,3%, Intercampus de 16-20/7: 9,5%, Marktest de 20-26/7: 7,5%). Parece haver um tecto de crescimento para os partidos de protesto e o PCP já terá alcançado o seu. A partir daqui, restar-lhe-á tentar evitar perdas maiores. Até quando?
quarta-feira, 4 de agosto de 2010
Crise, IRC, prestações sociais, submarinos. Opções políticas
No início dos anos 90, 33% das empresas portuguesas declaravam prejuízo eximindo-se assim do pagamento do IRC. Passados 20 anos aquele número subiu para 36%. Quantas empresas conseguem sobreviver a 20 anos de prejuízos? De facto, pouquíssimas. Contudo é gigantesco número daquelas que recorre sistematicamente à subfacturação para ocultar os seus lucros para fugir ao fisco.
O governo mostra-se incapaz de inverter esta situação, mas, em contrapartida é muito rápido em encontrar outras formas de contrariar o défice das contas públicas. Entraram já em vigor as medidas que se vão traduzir numa redução do número de pessoas que beneficiam do subsídio de desemprego e do RSI. Diz-se que se trata da aplicação de uma política mais rigorosa que visa corrigir eventuais abusos. S assim fosse, a exclusão dos abusadores, deveria ser compensada pela atribuição dessa prestações sociais a pessoas verdadeiramente necessitadas e que foram excluídas, pois desempregados e pobres não faltam. Mas, como se sabe, aquilo de que se trata é simplesmente de poupar dinheiro.
Quem pode pagar exime-se ao pagamento de impostos, quem precisa vê as prestações sociais do Estado serem-lhe retiradas.
Finalmente, a cereja em cima do bolo. Chegou o primeiro dos submarinos Tridente. Ninguém (a não ser o Chefe do Estado-Maior da Armada) sabe para o que servem. Sabe-se que têm de ser pagos, que não são um brinquedo barato e que o seu pagamento resultará num agravamento da dívida pública.
segunda-feira, 2 de agosto de 2010
O que significa ser de esquerda?
A questão do Poder encontra-se no centro da acção política. Como conquistar o poder, como conservá-lo? Desde Maquiavel, sabemos todos que essa é a questão central. Nas sociedades modernas, a luta pelo poder parece ser travada pelos partidos políticos e pelos seus líderes, que disputam o apoio das massas populares. Mas essa é apenas a face mais visível das coisas, em última análise, trata-se duma luta entre classes e grupos sociais. Sendo assim, “ser de esquerda” significa que, nessa luta, se toma partido pelos “de baixo”, pelos dominados contras os poderosos, pelos explorados contra os exploradores, pelos excluídos contra os privilegiados.
Já vimos num post anterior que “ser de direita” significa acreditar que aquela divisão se inscreve na ordem natural da vida: sempre foi assim e sempre assim será. Ser de esquerda significa que, como nos propõe Brecht (A Excepção e a Regra), não temos que achar natural, aquilo que sempre acontece. Significa acreditar que as contradições de classe são uma realidade historicamente transitória e ter como horizonte a utopia duma sociedade igualitária.
Na oposição esquerda / direita confundem-se, portanto, diferentes interesses de classe com diferentes convicções ideológicas.
No plano social, pertencerão ao campo da esquerda as classes populares, a classe operária, o proletariado rural, os trabalhadores dos transportes, dos serviços e do comércio. Integram-no grupos sociais que gozam de diferentes condições materiais de vida e têm práticas sociais muito diversas, mas que estão unidos por um denominador comum: a defesa dos interesses de cada um dos seus membros não passa pela concorrência entre si (como acontece com os empresários e as profissões liberais), mas sobretudo pela sua capacidade de promover acções solidárias.
No plano político, é comum a distinção entre uma esquerda revolucionária e uma esquerda reformista ou entre uma esquerda totalitária e uma esquerda democrática. Por esquerda democrática, entende-se habitualmente aquela que não considera a liberdade individual, o pluralismo político e a democracia representativa como simples valores instrumentais, mas como parte integrante do seu próprio património, que considera ser possível construir uma sociedade mais igualitária sem pôr em causa os princípios fundamentais onde assentam as democracias liberais. A esquerda totalitária, pelo contrário, considera que uma sociedade igualitária só pode resultar dum acto de força, dum movimento de massas conduzido por uma vanguarda política que se assume como intérprete dos interesses do povo e do destino da história e que, por isso, se sente legitimada para eliminar politicamente todos aqueles que se atravessem no seu caminho. Essa vanguarda concentra em si não só todo o poder político, como o poder económico e o controle da comunicação social, das instituições culturais e de acção social.
Considerando uma experiência multivariada e já secular, verificamos que das vitórias alcançadas pela esquerda revolucionária resultou sempre a instauração de poderes totalitários. Por outro lado, a esquerda reformista tende a perder a perspectiva da utopia igualitária, conformando-se com um melhorismo que não põe em causa os fundamentos das sociedades que pretendia combater.
A possibilidade duma nova sociedade nascida duma esquerda democrática e revolucionária é algo que a experiência histórica não foi ainda capaz de demonstrar e este facto pesa duma forma decisiva sobra as opções políticas daqueles que aspiram a uma sociedade mais justa.
Assim, nas sociedades capitalistas mais desenvolvidas, a esquerda revolucionária tende a confinar-se a uma “esquerda de protesto”, a quem as classes populares oferecem apoios pontuais, mas a quem não entregam o poder. Pelo contrário, a esquerda reformista afirma-se como uma esquerda “de governo”, mas, uma vez no poder, conforma-se facilmente com as regras da sociedade que deveria combater.
A solução para a direita passa pela restrição das liberdades democráticas. Para a esquerda, só pode passar pelo seu alargamento. O socialismo é uma democracia radical.