Joel Neto, em artigo de opinião para a Noticias Sábado do JN de ontem escreveu exatamente aquilo que penso, e nunca fui capaz de pôr por escrito de uma forma tão límpida, acerca das brasileiras e brasileiros que buscam este retângulo frequentemente pequenino e provinciano.
Por isso aqui vos deixo o artigo na integra:
"Num doce balanço, a caminho do mar
Como se já não bastassem os gays, agora temos as brasileiras. Todos os meses, esteja eu em Lisboa ou nos Açores, no Minho ou no Alentejo, ouço uma mulher portuguesa, a propósito de um filho, de um vizinho ou (sobretudo) de um pretendente involuntário, ter um desabafo do gênero: «Eu não sou nada xenófoba, juro. Mas, caramba, ele vai casar com uma brasileira... com uma brasileira!» Para uma certa categoria de portugueses, mais valia que os filhos, os vizinhos e os ex-futuros maridos casassem com uma boneca insuflável, uma ovelha ou mesmo uma abóbora, para citar apenas as heroinas românticas de Saramago. Brasileiras é que não. São todas levianas, vêm todas à procura de dinheiro - e, se o casamento der para o torto, de bom grado passarão a dedicar-se à má vida.
Não são apenas as mulheres a desdenhar do que vem do Brasil, diga-se. Para muitos de nós, o brasileiro é o português que relaxou e saiu para sambar. Pensamo-lo nós, os detentores da mais frágil economia europeia, sobre eles, os protagonistas de uma das economias mais fulgurantes do mundo: po brasileiro é o português que fracassou na vida. O país que construiu, e nós também conhecemos durante aquela semana que passamos em Porto Galinhas, é uma coisa sem rei nem roque, manhosa e cheia de segundas intenções - e ele próprio, naturalmente, é assim também: vigarista e falinhas mansas, preguiçoso e ladrão de bancos. Se for futebolista, claro, pode jogar na Selecção portuguesa. Mas com o mesmo estatuto que, antigamente, tinham as criadas trazidas da província: gente para lavar os paninhos da senhora, corresponder às necessidades do senhor, ajudar na iniciação do menino - e depois ir parir longe, a desavergonhada.
Pois eu, que li o Érico e ouvi o Chico, que me ri com o Jô e dancei com a bateria do Salgueiro, que fiz amigos e Porto Alegre e me apaixoinei em São Paulo - eu sei demasiado do Brasil e dos brasileiros para embarcar nessa conversa dos manhosos e arrivistas. Dizer que todos as brasileiras são levianas é o mesmo que dizer que todos os portugueses emigrados no Brasil são padeiros e se chamam Seu Manoel e que todas as portuguesas emigradas em França são porteiras e se chamam Madame Silvá. E, assim de repente, lembro-me de umas quatro ou cinco brasileiras com quem casaria sem pestanejar (se não fosse já casado, isto é): Gisele Bündcher, Maria Rita, Maitê Proença (sim, Maitê Proença), Camila Pitanga, Juliana Paes. Estas todas e, aliás uma série de outras que me interessariam sobretudo por razões físicas, portanto não intelectuais.
Casaria eu e casará, com total apoio do pai, um filho meu, se assim o entender. Mesmo sendo açoriano, sempre fui muito bem acolhido aqui, neste vosso país - e nada terei contra um casamento com uma nativa, tentação em que eu próprio já caí. Mas há algo numa brasileira bonita que me encanta. Talvez seja apenas o sotaque, mas o mais provável é que seja o facto de quase todas parecerem saídas de uma daquelas telenovelas que me povoaram a adolescência. Más, as novelas brasileiras? Pelo amor de Deus: as novelas brasileiras puseram frente a frente os ricos e os pobres (e depois misturaram-nos); puseram frente a frente o homem e a mulher (e depois explicaram-lhes que não havia uma forma só de misturá-los); puseram frente a frente a obrigação e a diversão (e depois mostraram-nos que era possível elas coexistirem sem se misturarem). As novelas brasileiras foram os nossos anos sessenta: a nossa revolução sexual, a nossa libertação estética, a nossa democratização do quotidiano.
Não fossem as novelas brasileiras e, provavelmente, a depilação do buço teria demorado ainda mais tempo a implantar-se entre as portuguesas. De resto, há brasileiras que vêm para Potugal trabalhar como prostitutas? Pois ainda bem. Só vieram trazer savoir faire, perfume e dignidade à profissão. Tanto quanto me parece, não são as brasileiras que andam pelos semáforos e pelas rotundas deste país, caçando camionistas em troca de uns cobres para a dose seguinte. Pelo contrário, e depois de tantos anos de neo-realismo, o mercado está agora novamente bem servido de cortesãs, o que não deixa de ser um conforto para muita gente. No mais, e para um jovem português em idade de casar encontrar galdérias fatelas, não é preciso ir ao Brasil: basta ir às personagens de muitas telenovelas portuguesas - e, provavelmente, bastará, dentro de alguns anos, ir às raparigas autorizadas pelos pais a assistir diariamente àquelas paradas de maus custumes.
Resta acrescentar que o Brasil é um país do primeiro mundo, uma potência mundial, e continuaria a sê-lo fosse um país africano, europeu ou asiático. Quem me dera ter a mesma certeza sobre Portugal, estivesse era fora da Europa.
A verdade é que o Brasil só depende de sí mesmo para ser grande, Portugal será tanto maior quanto souber olhar para o Brasil, e para os brasileiros, de igual para igual, enquanto parceiros estamos condenados a fazer um caminho comum, lado a lado, caminhada que temos vindo a adiar com preconceitos que só nos diminuem.
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