quarta-feira, 9 de setembro de 2009

As propostas do Bloco para uma maior justiça fiscal (I)

A questão dos benefícios fiscais em despesas de saúde

O que diz José Sócrates: o Bloco quer acabar com os benefícios fiscais resultantes de despesas com a educação e com a saúde. O que diz o Programa do Bloco? O BE defende “a simplificação e redução do sistema de deduções e benefícios ao estritamente necessário nas despesas de saúde e educação” (O que quer o Bloco? 51 ideias para mudar Portugal. Lisboa: Bertrand, 2009, pág. 106). Não é o mesmo, pois não? Como interpretar o “estritamente necessário”?

Vejamos o caso das despesas com a Saúde. Actualmente, o Estado português paga as despesas efectuadas com tratamentos no estrangeiro se os recursos dos nossos hospitais não permitirem que eles se façam em Portugal. Nunca vi ninguém discordar. Então, porque não aplicar o mesmo princípio ás despesas com a saúde realizadas em consultórios e clínicas privadas? O Estado dará o seu contributo, nomeadamente através de benefícios fiscais, se os hospitais públicos não tiverem possibilidades de acompanhar e tratar os doentes que os procurem.

Em regra, isso não é “estritamente necessário”. Mas haverá sempre quem, por exemplo, prefira ser internado numa clínica privada onde não vai encontrar melhor assistência médica, mas, muito provavelmente, um conforto superior àquele que desfrutaria num hospital público. Têm toda a liberdade para fazer essa opção. Mas por que havemos de ser todos nós (isto é, o Estado) a contribuir para o pagamento das despesas inerentes através de benefícios fiscais? Por que é que a esmagadora maioria dos contribuintes portugueses, que é tratada em hospitais públicos, há-de contribuir com os seus impostos para que uma minoria com mais capacidade económica possa ser tratada em clínicas onde poderá desfrutar dos luxos de um hotel de muitas estrelas, em vez de ser obrigada a misturar-se com a "populaça" ?

É claro que não posso garantir que o serviço público esteja sempre em condições de responder em tempo útil às necessidades de todos. Sei muito bem, que os tempos de espera, por exemplo, nos serviços de estomatologia dos hospitais públicos são muitas vezes insuportáveis. Podemos, então ver-nos perante um caso em que é “estritamente necessário” o recurso a um dentista privado e as despesas daí decorrentes devem continuar a poder ser deduzidas no IRS.

Podemos todos invocar outros exemplos. Mas parece-me evidente que o objectivo final de um partido de esquerda só pode ser a de um serviço público eficiente, de qualidade, universal e gratuito. E quando essa meta for atingida, ninguém precisará de deduzir despesas de saúde nos impostos simplesmente porque não haverá despesas a deduzir.

1 comentário:

  1. Se houve aspecto em que F. Loução não foi sufcientemente eficaz foi em deixar bem clara essa ideia que o Cruz Mendes expressa no último parágrafo. Quanto a Sócrates, ou não entendeu a ideia ou (mais provavelmente) não quis entender.
    Um abraço.

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