Representatividade e
legitimidade democrática
A apresentação da moção de censura do
PS coloca-nos de novo perante o problema da legitimidade democrática do governo
PSD/CDS.
Vivemos no quadro de uma democracia
representativa, que no essencial defendo, embora considere que a sua forma
actual é susceptível de um desenvolvimento que vá no sentido de um reforço das
possibilidades de intervenção directa dos cidadãos no exercício do poder
político.
Para além disso, o ideal democrático,
isto é, a ideia de um governo do povo, implica um debate acerca das formas mais
adequadas de representação política que se encontra muito longe de estar
resolvido. Concretamente, o conceito de “representação” admite duas
interpretações distintas:
Podemos considerar que os
representantes do povo são aqueles que os cidadãos eleitores escolheram para,
nas instâncias políticas próprias, agirem como agiria o próprio povo se pudesse
intervir directamente nessas mesmas instâncias.
Ou, pelo contrário, podemos defender
que a ideia de representação implica uma transferência de poderes: uma vez
eleitos, os representantes políticos estão autorizados a agirem como bem
entenderem, encontrando-se dispensados de seguirem a opinião dos seus
eleitores.
Neste caso, dir-se-ia que o princípio
da soberania popular se esgota no momento eleitoral. A partir daí, a soberania
já não residiria no povo, mas nos órgãos de soberania que este elegeu.
Parece ser este o entendimento de
“democracia representativa” defendido por Passos Coelho & Cia. A
legitimidade democrática do governo reside no facto de contar com o apoio da
maioria dos deputados da Assembleia da República. Não importa que esses
deputados tenham sido eleitos com base num programa eleitoral que, de imediato,
passaram a ignorar e mesmo a contrariar. Não importa que o governo não disponha
da confiança dos parceiros sociais. Não importa que as suas políticas sejam
contestadas, inclusive, por membros destacados dos próprios partidos que o
apoiam. E, sobretudo, não importa que diferentes manifestações públicas tenham
tornado evidente o isolamento em que se encontra o governo.
Não é esse o meu entendimento de democracia
representativa.
O PS vai apresentar uma moção de censura
que, tal como aquelas que já foram apresentadas pelo PCP e pelo Bloco, será
chumbada por uma maioria de deputados que consideram não ter de prestar contas
àqueles que os elegeram, mas às direcções dos partidos de que dependem.
De facto, tudo indica que esses
deputados já não representam de facto aqueles que dizem representar. O PSD e o
CDS, dispondo de uma maioria absoluta no parlamento, contam com um apoio social
francamente minoritário. Por isso, a única solução democrática só pode ser a
sua demissão e a convocação de eleições antecipadas. O poder de decidir tem de
ser devolvido aos eleitores.
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