quarta-feira, 13 de março de 2013



O Bloco e o marxismo

No Bloco, o debate ideológico nunca é assumido enquanto tal, mas apresenta-se sempre, envergonhadamente, sob a capa das discussões em torno da democracia interna e das opções tácticas.

Finalmente, João Semedo, numa entrevista ao Expresso (9-3-13), a propósito da constituição da nova tendência promovida por si, por Francisco Louçã e por José Manuel Pureza, afirmou a dado passo:”Assumimo-nos como marxistas, mas olhamos para as correntes contemporâneas do socialismo crítico”.

A segunda oração desta frase é de tal forma vaga (O que significa “olhamos”? A que correntes do “socialismo crítico” se refere?) que não permite um comentário. Já a primeira é significativa e coloca-me perante alguns problemas. Antes de mais não conheço nenhum documento programático do Bloco nem encontro nos seus estatutos nada que o defina como “marxista”. Qual é, pois, o sujeito da referida afirmação? Semedo, Louçã e Pureza consideram-se marxistas? Os membros da nova corrente consideram-se marxistas? A adesão ao marxismo é uma condição de acesso a essa nova corrente?

Sendo a resposta a esta última questão positiva, então não preciso de outras razões para não aderir à nova tendência, uma vez que não sou marxista. Por outro lado, não há dúvidas de que não é essa a razão que explica que haja militantes da UDP e do PSR que recusem a dissolução das tendências a que pertencem, pois também os seus aderentes se assumem como marxistas. O documento aprovado na última conferência nacional da UDP intitula-se mesmo “Marxistas, também amanhã” e os militantes do PSR sempre se assumiram como trotskistas (alinhados com as posições do chamado “secretariado unificado” da IV Internacional). E também não é ela que explica a crítica dos militantes do Bloco apoiantes da lista B na última Convenção, entre os quais muitos se afirmam igualmente “marxistas”.

Portanto, sinto-me à margem de uma polémica que, embora isso não seja assumido explicitamente, opõe entre si pessoas com diferentes concepções do marxismo, mas onde não parece haver lugar para se questionar o próprio marxismo. Quando aderi, o Bloco era, de facto, um movimento plural que dificilmente se poderia definir em termos ideológicos. Conviviam no seu seio marxistas e outras pessoas que não se definiam como tal. De facto, julgo que, ainda hoje, muitos dos aderentes do Bloco não se define ideologicamente assim. E tenho a certeza que a esmagadora maioria do seu eleitorado não entende o socialismo, no sentido marxista do termo. Contudo, hoje, o BE parece um partido formado por diferentes tendências marxistas.

Um dos principais problemas de implantação do Bloco está, aliás, precisamente aqui, no enorme desfasamento ideológico que se pode verificar entre a sua elite militante e os seus simpatizantes e eleitorado. A maioria do potencial eleitorado do Bloco tende a apoiar as suas propostas caso a caso e faz depender esse apoio conjuntura política do momento. Mas não é capaz de avançar no sentido de estabelecer com ele uma relação de identificação profunda. Não o considera como o seu partido, mas antes como um partido eventualmente útil quando se trata de expressar um voto de protesto.

À medida que o pluralismo ideológico que caracterizava o Bloco nas suas origens se for perdendo, esse fosso que separa os seus militantes do seu eleitorado tornar-se-á cada vez mais profundo. E daí nada de bom poderá surgir.

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