O
Bloco e o marxismo
No Bloco, o debate ideológico nunca é
assumido enquanto tal, mas apresenta-se sempre, envergonhadamente, sob a capa
das discussões em torno da democracia interna e das opções tácticas.
Finalmente, João Semedo, numa
entrevista ao Expresso (9-3-13), a
propósito da constituição da nova tendência promovida por si, por Francisco
Louçã e por José Manuel Pureza, afirmou a dado passo:”Assumimo-nos como marxistas,
mas olhamos para as correntes contemporâneas do socialismo crítico”.
A segunda oração desta frase é de tal
forma vaga (O que significa “olhamos”? A que correntes do “socialismo crítico”
se refere?) que não permite um comentário. Já a primeira é significativa e
coloca-me perante alguns problemas. Antes de mais não conheço nenhum documento
programático do Bloco nem encontro nos seus estatutos nada que o defina como
“marxista”. Qual é, pois, o sujeito da referida afirmação? Semedo, Louçã e
Pureza consideram-se marxistas? Os membros da nova corrente consideram-se
marxistas? A adesão ao marxismo é uma condição de acesso a essa nova
corrente?
Sendo a resposta a esta última questão
positiva, então não preciso de outras razões para não aderir à nova tendência,
uma vez que não sou marxista. Por outro lado, não há dúvidas de que não é essa
a razão que explica que haja militantes da UDP e do PSR que recusem a
dissolução das tendências a que pertencem, pois também os seus aderentes se
assumem como marxistas. O documento aprovado na última conferência nacional da
UDP intitula-se mesmo “Marxistas, também amanhã” e os militantes do PSR sempre
se assumiram como trotskistas (alinhados com as posições do chamado
“secretariado unificado” da IV Internacional). E também não é ela que explica a
crítica dos militantes do Bloco apoiantes da lista B na última Convenção, entre
os quais muitos se afirmam igualmente “marxistas”.
Portanto, sinto-me à margem de uma
polémica que, embora isso não seja assumido explicitamente, opõe entre si
pessoas com diferentes concepções do marxismo, mas onde não parece haver lugar
para se questionar o próprio marxismo. Quando aderi, o Bloco era, de facto, um
movimento plural que dificilmente se poderia definir em termos ideológicos.
Conviviam no seu seio marxistas e outras pessoas que não se definiam como tal.
De facto, julgo que, ainda hoje, muitos dos aderentes do Bloco não se define
ideologicamente assim. E tenho a certeza que a esmagadora maioria do seu
eleitorado não entende o socialismo, no sentido marxista do termo. Contudo, hoje, o BE parece um partido formado por diferentes tendências marxistas.
Um dos principais problemas de
implantação do Bloco está, aliás, precisamente aqui, no enorme desfasamento
ideológico que se pode verificar entre a sua elite militante e os
seus simpatizantes e eleitorado. A maioria do potencial eleitorado do Bloco tende a apoiar as suas propostas caso a caso e faz depender esse apoio conjuntura política do momento. Mas não é capaz de avançar no sentido de estabelecer com ele uma relação de identificação profunda. Não o considera como o seu partido, mas antes como um partido eventualmente útil quando se trata de expressar um voto de protesto.
À medida que o pluralismo ideológico que
caracterizava o Bloco nas suas origens se for perdendo, esse fosso que separa os seus militantes do seu eleitorado tornar-se-á
cada vez mais profundo. E daí nada de bom poderá surgir.
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