Otelices – parte 3
Ainda a propósito da recente palestra de Otelo Saraiva de Carvalho em Coimbra, um apontamento breve sobre a sua referência à Islândia, um “caso notável de reacção popular recente”, onde o povo “prendeu os políticos, prendeu os banqueiros e disse que não pagava dívida nenhuma”.
Digamos que não é fácil reunir tantas asneiras em tão poucas linhas.
Em primeiro lugar, na Islândia, o povo não disse que “não pagava dívida nenhuma”. Realizaram-se dois referendos onde foi decidido não indemnizar o Reino Unido e a Holanda de 3,9 milhões de euros investidos por particulares desses países nas actividades especulativas de um banco islandês que faliu em 2008. As dívidas contraídas pelo Estado islandês estão, evidentemente, a ser pagas.
Em segundo lugar, “o povo” não prendeu “os políticos”. A Islândia é um Estado de Direito. Há leis que são respeitadas e um sistema judicial que funciona. Ninguém está acima das leis e o antigo primeiro-ministro foi chamado a tribunal e será condenado se se provar que as infringiu. Tal como aconteceu em Portugal, por exemplo, com Isaltino de Morais, que, aliás, contou com o apoio de Otelo nas últimas eleições autárquicas.
Em terceiro lugar, “o povo” também não prendeu “os banqueiros”. Há alguns administradores acusados, tal como o foi aqui Oliveira e Costa. Infelizmente, ainda continuamos à espera do desenvolvimento do “caso BPN”.
São justas as críticas que têm sido feitas à ineficácia do Ministério Público na investigação dos crimes “de colarinho branco” e à lentidão do sistema judicial português. Mas a solução não está nessa espécie de “justiça popular”, que não existe na Islândia nem em lado nenhum, a não ser na mente confusa de Otelo.
Uma nota final: já se iniciaram as negociações com vista à integração da Islândia na União Europeia. O que é que Otelo pensará disso?
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