segunda-feira, 12 de outubro de 2009

QUATRO NOTAS
SOBRE AS ELEIÇÕES AUTÁRQUICAS


1) Quem ganhou e quem perdeu

O PSD conserva a presidência da maioria das Câmaras (140) e, portanto, da ANMP. Três Câmaras dos quatro maiores concelhos portugueses, Porto, Vila Nova de Gaia e Sintra, continuam nas suas mãos. No entanto, detém o poder em menos dezassete do que em 2005 e, duma maneira geral, perde votos e mandatos. A crise aberta no partido com a derrota nas legislativas fica mal disfarçada por estes resultados.

Em relação a 2005, o PS subiu de 110 para 131 presidências de câmaras e teve, a nível nacional, a maioria dos votos e mandatos. Além disso, conservou a presidência da Câmara de Lisboa. Fortemente penalizado nas europeias, as autárquicas vieram confirmar a recuperação do PS já anunciada pelos resultados das legislativas e surgem como um “aviso à navegação” para todos aqueles que forem tentados a precipitar a queda do próximo governo de José Sócrates. Arriscam-se a pagar caro a ousadia.

O PCP conserva 28 Câmaras (menos quatro do que nas últimas eleições), perde municípios como Beja, Sines e Marinha Grande e obtém um dos seus piores resultados autárquicos de sempre.

O CDS-PP e o BE mantêm uma implantação autárquica irrisória. O partido de Paulo Portas de alguma forma disfarça a fraqueza das suas estruturas locais através de múltiplas coligações com o PSD. Já o Bloco, optando pela linha do orgulhosamente só, deixa a claro todas as suas fragilidades.

2) A derrota do BE em Lisboa

Em Lisboa, o objectivo principal do Bloco era a eleição de Luís Fazenda para a vereação. Para muitos esta derrota terá surgido como uma surpresa. Confesso que a adivinhava há muito tempo. Trata-se do desfecho lógico de uma longa série de erros políticos, cujo início se encontra desde logo na forma como foram geridas as relações entre o BE, José Sá Fernandes e o grupo de personalidades independentes que o apoiava. Nos seus primeiros dois mandatos como vereador, Sá Fernandes comportou-se fundamentalmente como um contrapoder e, para isso, contou com todo o apoio do Bloco. A partir das últimas eleições, ambicionou deixar obra feita em Lisboa. Do “Zé faz falta”, passou-se ao “Zé faz”. E, para isso, teria que se aproximar de António Costa que, na presidência da Câmara, era quem lhe poderia proporcionar os meios necessários para cumprir os seus projectos. Acontece que o Bloco se manteve numa lógica de contrapoder. Considerava António Costa como um representante do governo na Câmara e queria que o seu vereador fizesse do seu cargo uma frente da oposição. Sá Fernandes pensava, bem ou mal, naquilo que podia fazer por Lisboa, o BE subordinava, necessariamente mal, a sua intervenção autárquica à lógica da intervenção nacional. Estavam condenados a afastar-se. A partir daqui, o Bloco passou a tratar qualquer divergência com Sá Fernandes não como um problema a resolver, mas como mais um pretexto para justificar uma ruptura. O resto da história já todos conhecem: a retirada da confiança política do BE a Sá Fernandes; a desajeitada tentativa de aproximação a Helena Roseta, logicamente condenada ao fracasso; a inclusão do Movimento de Cidadãos por Lisboa e de Lisboa é Muita Gente na lista de António Costa; o apoio empenhado de Manuel Alegre, de comunistas como José Saramago e de várias membros da Renovação Comunista à lista do PS numa ampla frente contra Santana Lopes, que o BE recusa integrar, enfim, o lançamento de uma candidatura suportada apenas pelo frágil aparelho partidário do BE e encabeçada por um deputado a quem ninguém reconhecia qualquer experiência autárquica nem outro projecto que não fosse o de ser "do contra”. Resultado: o Bloco teve uma das piores votações de sempre em eleições autárquicas em Lisboa. Por favor, não me venham tentar explicar tudo com a bipolarização. Em vez disso, expliquem-me lá outra vez o que significa aquela palavra-de-ordem, "Juntar Forças".

3) A maioria absoluta de Mesquita Machado em Braga

Afinal, as possibilidades de vitória de Ricardo Rio foram francamente exageradas. A Coligação Juntos por Braga (PSD/CDS-PP/PPM) alcançou vitórias significativas nas freguesias urbanas, mas Mesquita Machado venceu mais uma vez nas freguesias rurais que sempre foram o seu bastião.

A verdade é que não seria possível vencê-lo sem penetrar profundamente no seu eleitorado tradicional. A pergunta que todas as forças da oposição deveriam ter feito era: desta vez, o que pode levar aqueles que sempre votaram Mesquita Machado a retirarem-lhe o voto? E as respostas não podem ser as suspeitas de corrupção e enriquecimento ilícito, o tráfico de influências, os desmandos urbanísticos ou a subvalorização da vida cultural, porque todos esses argumentos, ainda que justíssimos, já foram invocados mil e uma vez, já conquistaram toda a gente que podiam conquistar e, como se sabe, nunca se revelaram suficientes para destronar o único Presidente da Câmara eleito em Braga desde o 25 de Abril.

A CDU e o BE queixam-se da bipolarização, mas o que fizeram para contrariar essa tendência? Nada e, na verdade, algo podia ter sido feito. À frente da direita anti-Mesquita, talvez se pudesse ter erguido uma frente de esquerda PCP-BE. Ter-se-ia, então, evitado o “voto útil” de certos sectores da esquerda na coligação PSD/CDS-PP/PPM e ficaria garantida a eleição de, pelo menos, um vereador. Julgo que esta hipótese nunca chegou a ser equacionada. O BE está ainda muito preso à necessidade adolescente de auto-afirmação (afinal, ainda só tem dez anos…) para poder pensar em coligações e o PCP continua a ver o Bloco como um intruso que apenas veio perturbar a sua própria função de vanguarda esclarecida das massas. Enfim, nem um nem outro elegeram vereadores. As manias de cada um derrotaram os dois.

4) Finalmente, a cacicagem vai cumprir o ultimo mandato a que tem direito

No último texto que escrevi aqui, previ a vitória dos “do costume” e desejei enganar-me. Infelizmente, não foi o caso, foram poucas as Câmaras que, dominadas por caciques, mudaram de mãos. Estar no poder é meio caminho andado para lá ficar. Fomos, mais uma vez, obrigados a verificar as vitórias do Isaltino, do Valentim Loureiro ou do Mesquita Machado. Ainda assim, há que festejar aqui a derrota de Fátima Felgueiras e o fracasso de tentativa de Ferreira Torres para regressar ao poder em Marco de Canavezes. Nem todos os caciques se safaram. Ainda assim, ficamos todos com a sensação de que a lei da limitação dos mandatos chegou tarde. Paciência, só mais um esforço!

2 comentários:

  1. O BE deve colocar em cima da mesa uma discussão saudável sobre a derrota eleitoral nas autárquicas : Nas distritais, na Mesa Nacional e na Comissão Política.

    ResponderEliminar
  2. Faria:

    Com certeza. Mas a discussão não pode limitar-se a essas instâncias. Nela devem poder participar todos os aderentes e simpatizantes do Bloco.

    ResponderEliminar