quinta-feira, 7 de julho de 2011

“Lixo”

Que as agências de rating não são observadoras objectivas e desinteressadas da situação económica e financeira dos Estados e instituições que analisam, já se sabia há muito tempo. Recordo, por exemplo, a petição entregue por José Reis e José Manuel Pureza (da Universidade de Coimbra) e de Manuel Brandão e Manuela Silva (do ISEG) que denunciava a sua dependência de accionistas directamente envolvidos em processos de especulação financeira e pedia à PGR que a Moody’s, a Standard & Poor’s e a Fitch fossem submetidas a um inquérito pelo crime de manipulação do mercado.

Contudo, estas denúncias foram sistematicamente desvalorizadas pelos economistas – comentadores de plantão nos órgãos de comunicação social portuguesa. No seu entender, os críticos das agências de rating limitavam-se a criticar os mensageiros porque não gostavam da mensagem, mas estas, afinal, limitavam-se a descrever objectivamente a situação portuguesa.

Defensores das receitas neoliberais, embandeiraram em arco com a nomeação do governo PSD/CDS e com as medidas de austeridade entretanto anunciadas. Agora, tudo iria entrar nos eixos. Vem a Moody’s e classifica os títulos de dívida pública emitidos pelo Estado português como lixo! Como é possível? Com certeza ainda não sabiam do imposto que nos vai levar metade do 13ª mês… Sabiam, já o disseram. Conhecem o PEC 5 de Passos Coelho, tal como conheciam os PEC’s 1, 2 , 3 e 4 de José Sócrates.

E, então, gerou-se um coro indignado contra as agências de rating cujas opiniões, ainda há tão pouco tempo, eram tão consideradas. De facto não são, nunca foram, analistas honestos, objectivos e desinteressados. O problema é que, pelo menos até hoje, se lhes tem dado crédito e, por isso, as suas profecias tendem a auto-realizar-se. Os primeiros resultados da avaliação da Moody’s já estão à vista: os juros das nossas obrigações no mercado secundário já voltaram a subir, o PSI 20 levou um tombo, a banca nacional vai ter cada vez mais dificuldade em financiar-se, o crédito bancário aos particulares será cada vez mais difícil e mais caro, etc.

Quer dizer, a Moody’s prevê uma recessão mais funda do que aquela que a troika prevê e, (em parte) por isso, essa recessão arrisca-se a ser um facto; a Moody’s prevê que, mais cedo ou mais tarde teremos que recorrer de novo ao FMI e, (em parte) por isso mesmo, essa possibilidade torna-se mais efectiva; a Moody’s prevê que vamos cair na situação da Grécia e, (em parte) por isso, é bem provável que assim seja. Não me admiraria que as outras duas agências americanas lhe sigam as pisadas. Portanto: “Lixo”.

Mas, chegados aqui, cumpre-me agora fazer o papel de advogado do diabo: é possível que, desta vez, a Moody’s tenha razão (até um relógio parado está certo duas vezes por dia). Talvez a receita neoliberal de Passos Coelho e da troika não sejam a solução. O Bloco de Esquerda, que não assinou o memorando da troika, repetiu-o vezes sem conta na última campanha eleitoral. Não foi ouvido e sofreu uma pesada derrota. Talvez tenha chegado a hora de voltar a olhar para as suas previsões e para as suas propostas.

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