Ter razão antes do tempo…
O Bloco de Esquerda foi um dos grandes derrotados das últimas eleições. Se essa derrota levar o partido a reflectir maduramente acerca do seu posicionamento político, ela pode ser o início de um novo ciclo do seu crescimento e de reafirmação da sua importância na sociedade portuguesa. Para isso, seria importante que se abrisse um tempo de debate, livre de tabus, de obediências dogmáticas e de lógicas de afirmação interna de grupos e tendências, capaz de promover um processo de clarificação ideológica que, passados doze anos sobre a fundação do Bloco, se tornou fundamental e inadiável.
Entretanto, é justo dizer que, nas circunstâncias em que decorreram estas eleições, uma derrota do Bloco era dificilmente evitável. A situação em que o governo de José Sócrates deixou o país, à beira da bancarrota, e a necessidade de um pedido de ajuda externa encontravam-se no centro das preocupações de todos os portugueses. A confissão de Teixeira dos Santos – dentro de dois meses, o Estado fica sem dinheiro para pagar salários e pensões – decidiu o resultado das eleições.
O memorando de entendimento com a troika FMI-CE-BCE foi assinado pelo PS, pelo PSD e pelo CDS, a primeira tranche de um empréstimo de 78 mil milhões de euros chegou a Portugal e a esmagadora maioria dos portugueses respirou de alívio.
Toda a campanha eleitoral do Bloco esteve centrada na denúncia dos termos desse acordo – nas consequências futuras das políticas de austeridade a que a troika nos obrigava. Mas aquilo que preocupava os portugueses não era o futuro, mas o presente. Os seus medos concentravam-se no dia de amanhã, depois se veria…
Podia o Bloco assinar um acordo que previa congelamento das pensões, crescimento do desemprego, aumento do IVA e redução das prestações sociais? Podia comprometer-se com uma política económica que vai lançar o país num ciclo de recessão económica cuja duração ninguém, honestamente, pode prever? Podia garantir que, nestas circunstâncias, seremos capazes de suportar os juros agiotas que nos vão cobrar pelo dinheiro emprestado?
O Bloco fez a única coisa que podia ter feito: recusou-se a assinar o memorando de entendimento e alertou os portugueses para o facto desta política nos poder empurrar para a situação em que a Grécia hoje se encontra. E defendeu, justamente, outro caminho, o da renegociação da dívida como condição do relançamento do crescimento económico. Simplesmente, não estavam minimamente preenchidas as condições políticas que nos permitiriam impor essa renegociação aos nossos credores e os problemas de financiamento do Estado exigiam soluções urgentes. Estávamos entre a espada e a parede e, a curto prazo, não havia soluções que fossem, simultaneamente, felizes e viáveis.
Nestas circunstâncias, havia que escolher um governo. Os eleitores puniram o PS e fizeram bem. Escolheram o PSD e o CDS porque não havia alternativa. E o Bloco foi duramente penalizado, não porque não tivesse razão, mas porque teve razão antes do tempo. Queria “mudar o futuro”, quando os portugueses estavam sobretudo preocupados com o “presente”.
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