quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

MEDIDAS DE COMBATE À CRISE

No Público de hoje publicam-se as “dez principais medidas de combate à crise” propostas pelos cinco principais partidos portugueses. É interessante verificar como as diferentes perspectivas ideológicas se exprimem nas diferentes propostas.


Assim, os partidos de esquerda (PCP e BE) põem o acento no investimento público, na defesa dos direitos dos trabalhadores e nas medidas de apoio aos desempregados, enquanto os partidos de direita (PSD e CDS) acentuam a necessidade de garantir a viabilidade das empresas privadas. O PS assume uma posição intermédia, que não satisfaz inteiramente nem os primeiros nem os segundos.

Talvez eu próprio não esteja tão manietado por preconceitos ideológicos e, por isso, e também por não me sentir subjugado pela necessidade de tudo subordinar a estratégias em grande parte determinadas pela ocorrência de uma série de eleições a curto prazo, dou comigo a encontrar aspectos positivos e negativos em todas elas.

Por exemplo, a aposta do PS na construção de barragens, na reparação de pontes e na requalificação dos edifícios escolares, parece-me correcta. Por outro lado, tenho muitas dúvidas acerca da oportunidade da construção do TGV, do novo Aeroporto e de uma nova ponte sobre o Tejo. Além disso, os créditos que deveriam chegar às empresas não parecem estar a atingir esse objectivo, a CGD afunda-se em créditos e avales à banca privada sem que haja garantias de retorno e o crédito à aquisição de habitação não dá sinais de descer como deveria. Finalmente, muitos desempregados não recebem qualquer subsídio e encontram-se ameaçados pela miséria. O número daqueles que vivem sob o limiar da pobreza não cessa de aumentar e muito daquilo que tem sido feito para ajudar essas pessoas não se deve ao governo, mas à acção das IPSS.

Muitas das medidas propostas pelo PSD de apoio às PME’s parecem-me justas e necessárias. Refiro-me, nomeadamente, à cobrança do IVA no momento em que se passa o recibo e não a factura, e ao estabelecimento de uma conta-corrente entre as PME’s e o Estado, de forma a que as dívidas do Estado a essas empresas possam ser acertadas no momento do pagamento dos impostos. Mas a proposta de suspensão da penalização, prevista no Código de Trabalho, para empresas que recorram a contratos a termo, significa um agravamento das pressões intoleráveis a que, à boleia da crise, se tem submetido todos os trabalhadores.

O PCP defende um aumento intercalar do salário mínimo, o que, no contexto actual, poderá ser perigoso. Além disso, o facto do salário mínimo ter sido revisto ainda há pouco tempo e da inflação estar a baixar não justifica um aumento intercalar. Por outro lado, pronuncia-se também pelo apoio às PME’s e, recentemente, Jerónimo de Sousa teceu mesmo alguns elogios às propostas do PSD nesse sentido, o que me pareceu ser uma atitude corajosa e correcta. Além disso, não posso deixar de concordar com propostas como a da revogação de aspectos negativos do Código de Trabalho, do reforço das prestações sociais do Estado aos trabalhadores no desemprego, da fiscalização rigorosa do recurso ao lay-off e com a adopção de um plano de combate à precariedade.

O CDS propõe, e eu estou de acordo, a revisão das prioridades nas “grandes obras” públicas, a redução entre 30 e 50% do Pagamento por Conta e do Pagamento Especial por Conta e a negociação de contrapartidas de manutenção do emprego em empresas onde o Estado fez injecções directas de capital. As “dez medidas” enviadas por este Partido ao Público não referem as suas objecções quanto à luta contra a precariedade e ao Rendimento de Reinserção Social com as quais, evidentemente, discordo.

Subscrevo sem hesitar a grande maioria das propostas feitas pelo BE: aumento de emergência para as pensões mais baixas, reforço do sistema bancário público, garantia de transferência de créditos de qualquer banco para a CGD a custo zero, renegociação de todas as dividas hipotecárias para reduzir o estrangulamento das famílias sobre endividadas, recusa de distribuição de dividendos em empresas que tenham subsídios públicos, registo de todos os movimentos internacionais de capitais, levantamento do sigilo bancário, e nacionalização do sector da energia. O desemprego assume proporções trágicas e deve estar na primeira linha das nossas preocupações. Mas parece-me que a proibição dos despedimentos em empresas com lucros, em princípio justa, deve admitir a possibilidade de existirem situações excepcionais. O caso dos despedimentos na Corticeira Amorim não pode se encarado da mesma forma do que os que puderem vir a ocorrer numa pequena empresa que tenha tido alguns lucros em 2008, mas cujas vendas possam ter iniciado nos últimos meses um processo de decréscimo acentuado, e que, nos fins de 2009, poderá estar às portas de uma falência. Nestas circunstâncias, a aplicação “à letra” daquela proposta pode ter consequências perversas em termos de desemprego. Quanto ao “reforço do investimento público nas prioridades nacionais”, é uma proposta demasiado vaga na ausência de uma definição prévia dessas prioridades (o TGV é uma delas?). Por fim, o BE é o único Partido que não se refere explicitamente à necessidade de apoiar as PME’s, das quais depende a vida de centenas de milhares de pessoas (75% da mão-de-obra nacional).

Se tivesse que optar por um único pacote, optaria pelo do BE, o único que inclui medidas que permitem combater o aumento dos spreads, que se verifica num contexto de descida acentuada da taxa euribor (devendo a CGD garantir empréstimos a juros não especulativos), bem como a fuga ao fisco, a corrupção e a lavagem de capitais. Mas, considerando que nenhum destes partidos terá maioria absoluta nas próximas legislativas, todas estas propostas vão estar “em cima da mesa” dentro de meses e serão discutidas, aprovadas ou rejeitadas, uma a uma, por maiorias conjunturais na Assembleia da República.

Portanto, e em última análise, o combate à crise passa por decisões políticas, sendo determinante saber qual será o peso de cada partido na próxima AR e que maiorias parlamentares se vão constituir.

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