quarta-feira, 3 de julho de 2013

A presente crise política e a revisão da lei eleitoral



O fim da coligação PSD-CDS abriu uma crise política que exige a convocação de eleições antecipadas. Isso é uma condição necessária para o aparecimento de uma alternativa política ao governo de Passos Coelho, mas não é uma condição suficiente. Receio bem que estejamos perante uma situação em que a direita já não é capaz de governar, mas a esquerda ainda não é capaz de o fazer. O caldo habitual donde já nasceram muitas soluções bonapartistas.

Não creio que, nos próximos meses, o PS, o PCP e o BE sejam capazes de ultrapassar as divergências que bloqueiam a possibilidade de formação de um governo de esquerda. E, nesse caso, provavelmente, das próximas eleições sairá um governo minoritário liderado por António José Seguro, pontualmente apoiado pelo CDS e manietado pelas exigências da Comissão Europeia.

Repetir experiências passadas, mudando de governantes sem mudar de políticas, pode ter um efeito devastador sobre o actual sistema político-partidário e mesmo sobre a confiança dos portugueses nos mecanismos da democracia representativa.

Prevenir a possibilidade de que o aprofundar da crise económica dê origem a uma tentação totalitária parece-me que, hoje, deve ser uma preocupação central de todos os democratas. Os partidos actualmente existentes estão reféns de lógicas de auto-afirmação que resultam apenas da vontade de satisfazer os interesses e anseios das suas redes clientelares e parecem cada vez menos capazes de ouvir os cidadãos comuns. Sendo assim, a defesa do regime democrático terá que passar necessariamente pela possibilidade destes fazerem ouvir a sua voz no seio do parlamento sem serem obrigados a sujeitar-se a uma intermediação partidária.

Na minha opinião, o parlamento que sair das próximas eleições legislativas deve ter na sua agenda a revisão da lei eleitoral, abrindo-a à possibilidade da apresentação de candidaturas independentes ao cargo de deputado. Penso que isso implicaria o aparecimento de círculos uninominais, onde o eleitorado seria chamado a votar em candidatos apresentados ou não pelos partidos, sendo eleito aquele que reunir um maior número de votos. Sabe-se que este sistema tem a desvantagem de distorcer gravemente a proporcionalidade entre os votos recebidos pelos diferentes partidos e o número de deputados que estes são capazes de eleger. Na prática, pode saldar-se pela eliminação dos partidos mais pequenos e, consequentemente, num empobrecimento da representatividade do parlamento. Contudo, isto pode ser contrariado pela criação de um círculo nacional, onde se apresentariam listas partidárias cujos candidatos seriam eleitos de acordo com a percentagem de votos obtida.

Por exemplo, numa AR formada por 200 deputados, 100 seriam eleitos em círculos uninominais e os restantes no círculo nacional. Num sistema de proporcionalidade directa, um pequeno partido que não conseguisse vencer em nenhum círculo uninominal, mas obtivesse, digamos, 8% dos votos no círculo nacional, elegeria 8 deputados.

Num cômputo final, teríamos um parlamento formado por deputados dos maiores partidos, por deputados de partidos mais pequenos e por deputados independentes. Penso que se conseguiria assim uma representação mais rica e diversificada do parlamento, e que se obrigaria os partidos (que continuariam a ter um papel fundamental no jogo democrático) a repensar a sua forma de se relacionarem com a sociedade civil, sob pena de sofrerem pesadas derrotas nos círculos uninominais.

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