domingo, 5 de fevereiro de 2012

A paisagem depois da batalha

Muitas pessoas, incluindo economistas reputados de diferentes quadrantes políticos, já compreenderam que a receitas austeritárias preconizadas pela Troika e diligentemente aplicadas pelo Governo só conduzem à recessão, e que da recessão económica não pode resultar a redução da dívida mas apenas o seu agravamento.

Não faltam vozes insuspeitas (porque não têm origem em Portugal nem na “oposição”) que consideram que o caminho que estamos a seguir nos conduz fatalmente à bancarrota. Há, dizem, 70% de possibilidades de que isso venha a acontecer. As empresas de rating aconselham os investidores a não comprar as obrigações emitidas pelo Estado português porque as consideram incobráveis, são “lixo” – e desta vez têm razão.

Mas, segundo Passos Coelho, não é necessário renegociar o acordo com a Troika. Não precisamos de mais dinheiro, nem de mais tempo. Muito menos devemos pôr a hipótese de questionar os montantes da dívida e dos juros que nos estão a ser exigidos.

O acordo com a Troika é para cumprir “custe o que custar”. Portanto, na sua opinião, a continuidade desta política não depende de uma avaliação dos seus resultados.

Monopólios naturais com importância estratégica na definição da política económica do país são vendidos a Estados estrangeiros? As pequenas e médias empresas abrem falências aos milhares? O desemprego não para de crescer? Os pobres são cada vez mais e cada vez mais pobres? A classe média está ameaçada? Os jovens licenciados são aconselhados a emigrar? Quem comprou um apartamento a crédito, entrega-o ao banco? Quem tem ouro em casa põe-no no prego?

E, depois de tudo isto, os juros das obrigações da dívida pública portuguesa batem recordes no mercado secundário?

Para Passos Coelho e para os “Chicago Boys” que se instalaram no seu governo, não importa. Da destruição do que resta do nosso tecido económico – nascerá o progresso; da facilitação dos despedimentos – resultará a diminuição do desemprego; da descida dos salários – derivará o bem-estar; da destruição do Estado social – sairão melhores reformas, melhor saúde, melhor educação.

O milagre tem data marcada: tudo isto vai acontecer em 2013. E se assim não for? Para Passos Coelho essa hipótese nem se coloca. Afinal, os livros de Milton Friedman que lhe impingiram na escola dizem que não pode ser doutra maneira.

Se, em 2013, Portugal não estiver em condições de obter financiamento nos mercados financeiros e se nos vierem dizer que temos que recorrer a um novo “resgate” da Troika, se então se perceber que a receita de Passos Coelho falhou, que todos os sacrifícios que nos foram impostos foram feitos em vão, restará ao Governo (que já disse que não tem um “plano B” para o caso deste não resultar) pedir a sua demissão.

Na minha opinião, é isso que vai acontecer. Mesmo no seio da direita, observa-se que existe já quem se esteja a preparar para o day after. Este governo não concluirá o seu mandato. Até hoje, a esquerda tem-se limitado ao protesto, à “indignação”. Deve começar desde já a construir alternativas possíveis de governo. A ver se ainda se pode salvar alguma coisa.

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