quarta-feira, 14 de setembro de 2011

O ABC da(s) crise(s)

A Formiga de Esopo está de regresso depois de um período de férias relativamente prolongado. A crise onde nos afundámos, essa não foi de férias, mas conheceu novos desenvolvimentos. Antes de nos debruçarmos sobre as novidades, regressemos ao básico.

A crise tem duas caras: por um lado, é uma crise financeira (crescimento da dívida pública e privada e endividamento do Estado e das famílias); por outro, é uma crise económica e social (falências e desemprego). Para a enfrentar, podemos privilegiar o combate à crise financeira, aplicando medidas de austeridade e reduzindo despesas; ou privilegiar o combate à crise económica, promovendo o crescimento económico.

A direita tem defendido que a promoção do crescimento depende da resolução da crise financeira e que esta implica uma política de austeridade. A esquerda, pelo contrário, considera que a crise financeira só terá solução quando conseguirmos vencer a crise económica.

As duas estratégias são dificilmente conciliáveis. Os neoliberais, defensores do Estado mínimo, vêm na crise uma oportunidade de ouro para reduzir as despesas públicas com a segurança social, a educação e a saúde. A liquidação do Estado social, a partir de agora considerado insustentável (e, portanto, reduzido a uma função assistencial que teria como destinatários os "pobrezinhos"), permitiria reduzir impostos, aumentar lucros e promover investimentos. Os keynesianos, pelo contrário, afirmam que as medidas de austeridade têm como consequência a redução da procura e provocam efeitos recessivos e defendem que a promoção do crescimento económico, num contexto de retracção do investimento privado, implica uma aposta consistente no investimento público.

A primeira tem sido a opção dominante e está claramente plasmada no memorando da troika. As consequências são evidentes: quebra do poder de compra, diminuição da procura, falências e desemprego. Logo, uma diminuição das receitas fiscais que se pretende contrariar com sucessivos aumentos de impostos. Cria-se um círculo vicioso que nos conduz da austeridade à recessão e da recessão à austeridade. É a “receita grega” com os resultados que se conhecem.

A alternativa estaria na aposta no crescimento económico. Só criando empregos e relançando o consumo é possível criar riqueza e, a prazo, reduzir o nosso défice orçamental. Porém, o investimento público encontra-se condicionado pelo facto dos recursos financeiros do Estado se encontrarem mobilizados para o pagamento, com juros insustentáveis, da dívida pública, e é contrariado pelo facto da política do governo seguir o programa "austeritário" definido no memorando assinado com a troika.

É possível sair deste impasse? A solução estaria na renegociação da dívida (num alargamento dos prazos de pagamento e numa redução dos juros devidos) e na denúncia dos termos daquele memorando. Solução rejeitada pelo governo e pelo maior partido da oposição. Ou seja, o combate à crise económica é, antes de mais, um combate político e um conflito ideológico.

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