domingo, 22 de janeiro de 2012

Crescimento, produtividade e competitividade

Não duvido que o crescimento económico seja fundamental para a melhoria da condição de vida dos portugueses, do combate ao desemprego e da redução da dívida pública e privada. E que, para tal, seja necessário aumentar a produtividade e a competitividade das nossas empresas. Apenas não percebo a receita da troika / governo PSD-CDS para o conseguirem.

Para estes senhores, aumento de “produtividade” significa mais dias de trabalho e “competitividade” quer dizer salários mais baixos. Foi isso que quiseram obter com o tal “acordo de concertação social” assinado pelas confederações patronais e pela UGT.

Não sei com quem querem “competir”. Se os nossos competidores são os chineses ou os paquistaneses, então o dito “acordo” é insuficiente – seria necessário trabalhar muito mais por muito menos.

Serão países da União Europeia? Nesse caso, será útil comparar algumas realidades. Por exemplo, considerando a duração da jornada de trabalho, verifica-se que, em Portugal, ela é actualmente de 38,7 h por semana. No Reino Unido é de 37,5 h e em França de 35 h. Quanto, ao ordenado mínimo, em Portugal é de 485 euros. Na Irlanda, onde se observa uma balança comercial francamente positiva e onde, apesar da crise, as exportações continuam a crescer, o salário mínimo é de 1462 euros.

É claro que existem realidades diferentes. Na Roménia, o salário mínimo é de 153 euros e na Bulgária de 123. Quando Passos Coelho nos diz que, para sairmos da crise, temos que empobrecer, será nestes exemplos que está a pensar?

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

A propósito do acordo Governo - Confederações Patronais - UGT

Desemprego e salário


Actualmente, em Portugal haverá cerca de 800.000 desempregados. Mantendo-se a actual política de austeridade com efeitos fortemente recessivos, serão, segundo previsões oficiais, 1 milhão em 2013. Trata-se de uma verdadeira tragédia social. Traduz-se em pobreza e insegurança. 30% destes desempregados são jovens, muitos deles com qualificações académicas acima da média, mas sem perspectivas de futuro. Não é por acaso que a taxa de natalidade, em Portugal, já é das mais baixas da Europa e continua a descer.

No entanto, não se pense que esta realidade tem, para todos, os mesmos aspectos negativos. Muitos patrões consideram que, quantos mais desempregados existirem, mais pessoas haverá dispostas a trabalhar por uma côdea. Só esta situação permite que empresas altamente lucrativas, como a Jerónimo Martins, possa pagar aos seus trabalhadores salários miseráveis.

A condição fundamental para que o aumento de do desemprego se converta numa descida dos salários é a liberalização das relações laborais. Até hoje, isso tem avançado a cavalo dos contratos precários e dos falsos recibos verdes. O novo acordo assinado pelo governo, pelas confederações patronais e pela UGT, deu um passo decisivo para o alargamento desta situação a todo o mundo do trabalho.

A partir de agora, será mais fácil despedir, as indemnizações devidas aos trabalhadores despedidos serão mais baratas e a duração do subsídio de desemprego mais curta. O trabalho é uma mercadoria e a lei da oferta e da procura passará a funcionar mais livremente. Num contexto de grande desemprego, isso só pode traduzir-se num ataque aos salários.

Aliás, isso já ficou acordado no âmbito da chamada “concertação social”: férias mais curtas, menos feriados, fim da “semana inglesa”, horas extraordinárias mais baratas. Mais trabalho pelo mesmo salário nominal. Entretanto, a inflação ronda os 3%.

É extraordinário que a UGT cante vitória pelo facto do governo ter desistido da proposta de mais uma hora de trabalho gratuita por semana. Uma “brincadeira de crianças” ao lado do que foi acordado, como confessou Daniel Bessa.

Falta agora cumprir uma última etapa. O “acordo” só tem efeitos práticos depois da sua aprovação pela AR, onde passará, por certo, com os votos a favor do PSD e do CDS e os votos contra do PCP e do BE. Aguarda-se a decisão do PS. Vai votar contra ou, lavando as mãos como Pilatos, tal como fez com o Orçamento, vai-se abster?

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Os males e os dilemas dos tempos que correm…

Depois da 2ª Guerra Mundial, num contexto de crescimento económico e no quadro político da Guerra Fria, afirmou-se na Europa Ocidental um modelo de economia mista, sobretudo assente na propriedade privada, mas onde o Estado controlava sectores estratégicos da indústria e dos serviços e instrumentos políticos de regulação dos mercados e da redistribuição da riqueza.

A burguesia promovia a concertação social e aceitava a redução das desigualdades e a melhoria das condições de vida dos trabalhadores, como forma de os subtrair à influência dos partidos comunistas e da União Soviética. Afirmou-se o estado-providência: desenvolveram-se os serviços públicos de saúde, deram-se passos importantes na democratização do ensino, reforçou-se a segurança social.

A crise petrolífera dos anos 70 serviu de pretexto para os primeiros ataques ao chamado estado social europeu. O liberalismo económico, desacreditado pela crise dos anos 30, voltou a levantar a cabeça. Para defensores do neoliberalismo, o peso dos impostos inibe o investimento e condena a economia à estagnação. Retoma-se a defesa do “estado mínimo” e das virtudes da auto-regulação dos mercados. Entretanto, a implosão da União Soviética, permite aos ideólogos da direita proclamar o “fim da história”. Estava posto de lado o receio do espectro comunista e as concessões feitas ao movimento operário em termos de direitos sociais perdiam, pensavam eles, razão de ser.

Tinha chegado o momento do contra-ataque. Reagan e Tatcher foram os seus arautos, mas também os partidos social-democratas se renderam às novas modas. Blair foi o primeiro, a seguir vieram os outros. Abria-se um novo mundo: a globalização capitalista era o novo campo de batalha; a especulação financeira, a transferência massiça de capitais para os “paraísos fiscais” e a deslocalização de empresas para regiões onde pudessem explorar livremente mão-de-obra semi-escravizada e ignorar impunemente regras de protecção ambiental, passaram a ser as grandes armas. Do dia para a noite, houve quem acumulasse fortunas gigantescas. Um paraíso!

Então, veio a “crise”. Falências, desemprego, pobreza. E de novo os teóricos do costume: “os trabalhadores vivem acima das suas possibilidades”, “o modelo social europeu é insustentável”, “o Estado tem que emagrecer”…

É preciso dizer que os Medina Carreira e os Pulido Valente de todo o mundo têm razão: neste contexto, o “estado social europeu” deixou de ser viável. De facto, ele não é compatível com a especulação financeira, com a legalização da evasão fiscal, com a desregulação dos mercados, com a afirmação de uma economia global onde o “crime” compensa.

Apenas não têm razão quando nos apresentam o seu fim como uma fatalidade. Há uma escolha política a fazer. Cabe-nos a nós escolher.