quarta-feira, 27 de julho de 2011

Nem com ele, nem sem ele

“Ele” pode ser o PS, mas também pode ser o BE. A questão é: “Com quem construir uma maioria de esquerda, com incidência governamental, alternativa às maiorias de direita que nos têm governado?”

Tem sido colocada nestes termos por André Freire:

Em Portugal, a direita entende-se facilmente e o PSD e o CDS, já governaram coligados por três vezes. O mesmo não acontece à esquerda. Não há um só exemplo de um governo constitucional apoiado por uma coligação PS – PCP ou PS – BE.

Considerando existir uma opinião pública tendencialmente favorável a situações de estabilidade política, particularmente em conjunturas de grave crise económica como aquela que vivemos hoje, isto favorece desde logo soluções governativas de direita, mesmo que se acredite existir, no nosso país, uma “maioria sociológica de esquerda”.

Como sair deste impasse?

Para o BE, a culpa desta situação cabe ao PS. O próprio André Freire considera que temos, em Portugal, um dos partidos socialistas mais centristas da Europa. No governo, sempre que necessitou de apoio parlamentar, procurou-o (e , muitas vezes, encontrou-o) no CDS e no PSD. Por falta de um parceiro de esquerda disposto a assumir responsabilidades governativas? Não necessariamente. Como nota Francisco Louçã, (numa entrevista recente ao Público) quando dispôs de uma maioria absoluta, com o 1º governo de José Sócrates, o PS continuou a governar “à direita”. Assim, para Louçã, acreditar que aliado ao Bloco o PS ficaria "ancorado à esquerda" é o mesmo que acreditar num “milagre de Fátima”. Esta hipótese é tanto mais inverosímil quando, como acontece agora, temos o PS amarrado ao acordo com a troika e só pode acreditar nela quem estiver disposto a fechar os olhos a tudo "para fazer uma carreira de secretário de Estado".

Qual é então a solução? Na sua opinião, o BE deve aliar-se “com sindicalistas, movimentos de jovens precários, tudo o que na sociedade faz uma esquerda social, que é muito maior que uma esquerda política”. Ou seja, deve manter as suas posições políticas e continuar aquilo que já vem fazendo. Na sua opinião, poderá, por aí, subir em termos eleitorais até aos 15%. Dando de barato essa possibilidade, continuam a faltar, no mínimo, mais 30% par que se constitua uma maioria parlamentar de esquerda. Donde é que eles podem vir? Do PCP? De um novo partido, capaz de atrair a maioria do eleitorado do PS? É claro que Louçã não se propõe adivinhar o futuro. No entanto, parece-me que talvez acredite neste “milagre de Fátima”.

Desde o 25 de Abril (há mais de 30 anos, portanto), a esquerda radical sonha com uma revolução que só não se realiza porque o PS tem desviado as “massas” do caminho que a levaria à vitória. Na minha opinião, essa “revolução” nunca se realizou, simplesmente, porque as “massas” nunca a desejaram. Em pleno PREC, a soma dos votos dos vários partidos da extrema-esquerda não alcançou os 3% (a UDP conseguiu eleger um deputado) e os votos do PCP (que aqueles consideravam “reformista”), somados aos do MDP, traduziram a preferência de 16,6% do eleitorado.

O conflito do BE com o PS é um conflito político (crítica das políticas de austeridade com efeitos recessivos, da distribuição injusta dos sacrifícios, das leis laborais facilitadoras dos despedimentos e da precariedade, da privatização de monopólios naturais e de empresas públicas com funções económicas ou sociais estratégicas, da influência de uma oligarquia económica e financeira sobre os governos de Sócrates, das práticas clientelares desenvolvidas à sombra desses governos, etc.) e, nessas matérias, a razão tem estado muitas vezes do lado do Bloco. Mas é também um conflito ideológico, com raízes históricas muito antigas, que continua por resolver, e que, mesmo quando não é assumido de uma forma explícita, condiciona subrepticiamente algumas das opções políticas adoptadas. E esse conflito não opõe apenas o Bloco aos dirigentes do PS, mas opõe-no à esmagadora maioria do eleitorado socialista.

É que a maioria dos dirigentes e militantes do BE é marxista, anticapitalista e revolucionária, enquanto a maioria do seu potencial eleitorado é pragmática, social-democrata e reformista. Por isso, “tem medo” do Bloco e tende a votar no PS. O PS explora esta contradição: Para os seus dirigentes, se não têm sido possíveis entendimentos à esquerda, a culpa cabe por inteiro ao "radicalismo" do Bloco.

Os partidos não são eternos e vivemos num mundo sacudido por grandes transformações. A implosão do sistema soviético, desacreditou uma concepção do socialismo entendida como ditadura do proletariado, colectivização dos meios de produção e economia centralmente planificada. Por outro lado, o fim da Guerra Fria e o desenvolvimento do processo de globalização mergulhou a social-democracia numa crise profunda. Não me parece que as soluções da esquerda, no futuro, se possam encontrar na reprodução de modelos passados. Mas, neste momento, e num plano estritamente partidário e eleitoral, nada me garante que aquilo que ocorreu nos últimos 30 anos não continue a repetir-se nos próximos tempos.

É claro, que poderá haver flutuações conjunturais mais ou menos importantes: em 2009 (quando ninguém acreditava na possibilidade de Manuela Ferreira Leite poder levar o PSD à vitória) uma parte significativa do eleitorado de esquerda votou “útil” no Bloco, para castigar o “centrismo” de Sócrates e o BE obteve uns 10% dos votos; em 2011, perante a ameaça de uma vitória de Passos Coelho, grande parte desse eleitorado voltou ao PS e o Bloco viu a sua votação descer para metade. Situações assim podem voltar a acontecer, mas essas oscilações não nos trazem nenhuma resposta para a pergunta que começamos por colocar: Como criar uma maioria capaz de sustentar um governo de esquerda?

Não imagino a possibilidade de um governo de esquerda sem o contributo do PS e do BE. Mas também sei que essa maioria não é possível com “este PS” e com “este Bloco” também não. A vida dirá se este impasse se pode resolver (devemos acreditar neste outro "milagre de Fátima"?) ou se continuaremos condenados a ter uma direita que governa e uma esquerda que protesta.

Enfim, resta-nos ter fé. Em qual dos "milagres" aposta o leitor?

terça-feira, 26 de julho de 2011

Defender o equilíbrio das contas públicas, o crescimento económico e o Estado Social…

Fui um telespectador atento e interessado da mesa redonda protagonizada por Santos Silva, Vítor Ramalho, João Galamba e Sónia Fertuzinhos na TVI 24.

(Por que é que continuo a escrever sobre o PS em vez de comentar, por exemplo, o massacre ocorrido na Noruega? Provavelmente, porque penso que não teria nada de importante a acrescentar àquilo que, por exemplo, Sérgio Lavos tem escrito no Arrastão. Por outro lado, interessa-me tudo aquilo que diz respeito ao PS porque sou daqueles que considera que, sem o seu contributo, dificilmente se construirão alternativas de esquerda com incidência governativa, em Portugal.)

Voltemos, então, à mesa redonda. Aquilo que lá foi dito dava-me pano para mangas. Por hoje, fico pelos objectivos traçados por Sónia Fertuzinhos. No mundo complexo em que vivemos hoje, afirmou a deputada do PS, o grande desígnio do seu partido é o de conseguir harmonizar o equilíbrio as contas públicas, a promoção do crescimento económico e a defesa do Estado Social.

Considerando que, depois de seis anos de governação, o PS deixou o país nas mãos dos credores, em recessão económica e que mais de metade dos 700 mil desempregados não beneficiam do subsídio de desemprego, pergunta-se: Que balanço faz Sónia Fertuzinhos da governação de José Sócrates? Como votou ela nestes anos em que foi deputada?

domingo, 24 de julho de 2011

A vitória do silêncio

Diz-se que a palavra é de prata, mas o silêncio é de ouro. A eleição de António José Seguro para secretário-geral do PS vem dar razão a este popular aforismo.

No último Congresso, que quase por unanimidade, reelegeu Sócrates e glorificou a sua acção governativa, Seguro entrou mudo e saiu calado. Uma vez que não se juntou ao coro apologético, o seu silêncio foi interpretado como uma crítica. Mas, ao certo, o que é que criticava ele?

Na campanha eleitoral, contra Assis, não obtivemos respostas. Assim, cada militante do PS pode imaginar que Seguro defende aquilo que ele próprio mais gostaria que ele defendesse. E como, depois de uma derrota eleitoral, todos alimentam projectos de “refundação”, todos podem esperar que as suas ideias possam ser bem acolhidas no “laboratório” que Seguro lhes prometeu.

Puderam juntar-se, assim, no apoio a Seguro pessoas tão diferentes como Maria de Belém, Fonseca Ferreira (da “Esquerda Socialista”) e Vitalino Canas.

Está provado que, em política, aquilo que importa é saber gerir expectativas. E, pelos vistos, não defender nada é uma forma segura de não ofender ninguém e de criar amplos consensos.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

O PS vai a votos

Hoje e amanhã, realizam-se as “directas” para a eleição do novo secretário-geral do PS.

Ninguém ouviu a nenhum dos candidatos uma reflexão autocrítica acerca da acção do governo nos últimos seis anos. Também ninguém lhes ouviu novas propostas políticas. De resto, estando o partido amarrado aos termos do acordo assinado com a troika, também não se pode esperar do PS (seja qual for o próximo secretário-geral) uma oposição clara ao governo de Passos Coelho, que tem como programa fundamental o cumprimento desse mesmo acordo.

Já se sabe que Francisco Assis se apresenta como o candidato da “mudança na continuidade”, enquanto José Seguro propõe um “novo ciclo” de vida para o partido, mas, concluída a campanha eleitoral, não é fácil descobrir aquilo que os distingue. Seja como for, o PS vai a votos.

Até ontem, tinham as cotas em dia, e estavam, portanto, em condições de votar, cerca de 20 000 militantes. Nas últimas eleições votaram 29 341, tendo José Sócrates sido eleito com 26 713 votos (93,3%).

Destes eleitores, talvez um 1/5, possivelmente menos, participe regularmente nas actividades do partido. O PS é um partido de quadros e a actividade militante dos seus membros confunde-se com o desempenho de cargos políticos ou administrativos, exercidos por eleição ou nomeação, em diversas instâncias do aparelho de Estado.

É destas pessoas, da capacidade que tiverem ou não para chamar às urnas os filiados mais ou menos passivos e de os convencer das vantagens em votar no seu candidato, que depende o resultado das eleições.

Daí, a importância do “aparelho”, quer dizer, da direcção das Federações Distritais, das Concelhias, controladas por autarcas e deputados e, ainda, das organizações da JS. Compete ao aparelho “ir buscar as pessoas a casa”, convencê-las a actualizar as cotas (se for preciso, pagando-as) e a votar no candidato “certo”.

Actualmente, no PS, o candidato maioritariamente apoiado pelo aparelho é António José Seguro e, por isso é o favorito,

No distrito de Braga, António José Seguro encabeçou as últimas listas de candidatos à AR. Em Braga, Mesquita Machado apoia-o. Penso que a maioria das restantes concelhias também, assim como a JS. Logo, neste distrito, José Seguro tem a vitória garantida. Só não se percebe como é que daqui vai nascer um “novo ciclo”. Parece-me que, pelo contrário, quem o apoia o faz para manter os poderes que já detém. Pelo seguro, votam no António José, mas o lema de Assis assenta-lhes na perfeição: “mudança na continuidade”.

terça-feira, 19 de julho de 2011

A austeridade de uns e os lucros dos outros

Segundo Klaus Regling, presidente do Fundo Europeu de Estabilização Financeira, o resgate dos empréstimos concedidos a Portugal para financiamento da sua dívida soberana têm-se efectuado com lucros para as entidades emprestadoras e, cumpridos os programas de austeridade negociados com esses países, não há motivos para pensar que esta situação se altere.

Já sabemos que as medidas de austeridade que nos são impostas têm consequências recessivas, agravam a crise económica, provocam sofrimento social e não nos permitem sair da crise financeira em que nos encontramos.

Porquê insistir então nesta receita? O presidente do FEEF sugere-nos uma resposta possível: do ponto de vista dos nossos credores, será preferível que Portugal não entre num processo de insolvência, mas também não há razão para promover soluções que nos permitam escapar ao pagamento de juros especulativos. Esta é a situação ideal.